Tosa para Maltês: Guia Veterinário dos Estilos Mais Bonitos e Seguros
Você olha para o seu Maltês e vê aquela bolinha de pelos brancos correndo pela casa. É uma visão adorável, mas como veterinário, vejo algo além da fofura: vejo uma estrutura dermatológica complexa que exige manejo preciso. Diferente de muitas raças, o Maltês não possui subpelo. O que ele tem se assemelha muito ao cabelo humano. Isso significa que o pelo não cai sazonalmente como em um Pastor Alemão; ele cresce continuamente. Se você não cortar e cuidar, teremos problemas que vão muito além da estética.
A escolha do estilo de tosa para o seu Maltês define a qualidade de vida dele e a sua rotina de trabalho em casa. Muitos tutores chegam ao meu consultório com seus cães sofrendo de dermatites causadas por nós apertados, acreditando que a tosa é apenas “modinha”. Não é. A tosa correta permite que a pele respire, evita o superaquecimento (embora o pelo também sirva de isolante) e mantém a higiene sanitária em dia. Vamos mergulhar nos estilos mais bonitos, mas sempre com o olhar clínico sobre o que é melhor para o bem-estar do seu animal.
Ao decidir o próximo visual do seu companheiro, você deve considerar o estilo de vida da família. Vocês passeiam muito em parques com grama? O cão vive apenas dentro do apartamento no ar-condicionado? Você tem 20 minutos diários para escovação ou prefere algo quinzenal? Essas respostas guiarão a escolha entre uma tosa de exposição trabalhosa e um corte bebê super prático. Vamos explorar essas opções com profundidade.
A Anatomia da Pelagem do Maltês e a Necessidade da Tosa
Entender a estrutura capilar do seu Maltês é o primeiro passo para garantir que ele fique bonito e saudável. O Maltês possui uma pelagem de textura sedosa, única e sem a camada lanosa interna que protege outras raças do frio e da água. Por ser um fio único e contínuo, a tendência a formar nós é altíssima. No consultório, costumo explicar que a formação de um nó começa microscópica, com a fricção natural do movimento do cão. Se não houver intervenção, esse nó se aperta rente à pele, criando um ambiente quente e úmido perfeito para fungos e bactérias.
A tosa não serve apenas para deixar o cão com “cara de filhote”, ela é uma medida profilática. Quando removemos o excesso de pelagem, facilitamos a inspeção da pele. Muitas vezes, durante o banho e tosa, os profissionais encontram carrapatos, pequenas verrugas ou inícios de lesões de pele que estavam escondidos sob o manto branco. Manter a pelagem em um comprimento gerenciável é uma questão de medicina preventiva. Um cão livre de nós é um cão que se movimenta sem dor, pois nós severos repuxam a pele a cada passo que o animal dá.
Além disso, a saúde emocional do seu pet está ligada ao estado da pelagem. Já atendi animais que chegaram agressivos ou apáticos simplesmente porque estavam “presos” dentro da própria pelagem embaraçada. Ao realizar a tosa e remover esse peso e desconforto, o comportamento do animal muda instantaneamente. Ele volta a brincar e a interagir. Portanto, quando discutimos estilos de tosa, lembre-se que estamos falando também sobre liberdade de movimento e conforto físico para o seu melhor amigo.
Tosa Bebê ou Puppy Cut como Opção Prática
A Tosa Bebê, ou Puppy Cut, é disparada a favorita entre os tutores que buscam praticidade sem abrir mão da beleza. Esse estilo consiste em deixar a pelagem curta, geralmente com dois a três dedos de altura, uniforme por todo o corpo. O objetivo é simular a aparência de um filhote, com formas arredondadas e aspecto “fofinho”. Do ponto de vista veterinário, sou um grande fã desse corte para cães ativos. Ele reduz drasticamente a área de superfície onde gravetos, carrapichos e sujeira de rua podem aderir.
A execução desse corte exige tesoura em grande parte do acabamento, principalmente na cabeça e nas patas, para evitar aquele visual “raspado” artificial. O corpo pode ser feito na máquina com adaptadores altos, mas o charme está no rosto arredondado. Para o cão, a sensação de leveza é imediata. A manutenção em casa se torna muito mais simples: escovações duas a três vezes na semana são suficientes para evitar nós, ao contrário da escovação diária obrigatória da pelagem longa.
No entanto, mesmo sendo curta, a Tosa Bebê não significa ausência de cuidados. O pelo continua crescendo. Recomendo visitas ao tosador a cada 30 ou 45 dias para manter o formato. Se você deixar passar muito tempo, o corte perde a forma arredondada e os nós começam a surgir nas axilas e atrás das orelhas, locais de muito atrito. É o equilíbrio perfeito para quem quer o cão sempre limpo, com “cara de ursinho”, mas tem uma rotina corrida.
Tosa Padrão da Raça e Pelagem Longa
A tosa padrão, ou Full Coat, é aquela que vemos em exposições: o manto branco tocando o chão, liso e impecável, com o topete (top knot) amarrado na cabeça. É visualmente deslumbrante, mas exige um compromisso quase religioso do tutor. Para manter esse visual, a fibra capilar precisa estar extremamente hidratada e protegida. Veterinários e tosadores sabem que um pelo desse comprimento, ao arrastar no chão, funciona como uma vassoura, coletando bactérias, parasitas e detritos.
Se você optar por esse estilo, prepare-se para o uso de “papillotes” – papéis especiais para envolver as mechas de pelo e evitar que quebrem ou sujem. A escovação deve ser diária e meticulosa. Um único dia sem escovar pode gerar um nó que levará horas para ser desfeito, causando estresse e dor ao animal. Além disso, a tração excessiva ao fazer os penteados no topo da cabeça pode causar alopecia por tração, uma condição onde o pelo para de crescer devido à força constante do elástico.
Do ponto de vista clínico, indico esse corte apenas para cães de exposição ou tutores extremamente dedicados que vivem em ambientes muito controlados e limpos. Para o cão que gosta de correr na grama, rolar no tapete ou brincar com outros cães, a pelagem longa pode ser um impedimento e um risco higiênico. A urina e as fezes podem facilmente sujar a “saia” traseira, exigindo lavagens constantes que podem ressecar a pele se não forem feitos com produtos adequados.
Estilos Asiáticos e a Tosa Coreana
Nos últimos anos, a influência da estética asiática, especificamente a tosa coreana e japonesa, invadiu os pet shops brasileiros. E com razão: é um estilo que valoriza a expressão facial do cão. A característica principal desse estilo é o foco no focinho, que é tosado bem curto e arredondado (estilo “donut”), destacando os olhos grandes e escuros do Maltês. As orelhas costumam ficar compridas, criando um contraste interessante com o rosto limpo.
O corpo na tosa asiática geralmente é mantido curto, mas as pernas ficam com a pelagem mais longa, num formato cilíndrico ou de “pata de elefante”. Isso dá ao cão um caminhar elegante e divertido. Como veterinário, aprovo esse estilo porque ele libera a região dos olhos e da boca. Malteses sofrem muito com a oxidação dos pelos ao redor da boca devido à saliva e à água. Ao manter o focinho mais curto nesse estilo, reduzimos a umidade constante na região, prevenindo dermatites fúngicas no bigode.
Outro ponto positivo é a personalização. A tosa asiática permite o uso de acessórios, laços, golas e roupinhas sem que o pelo embole por baixo, já que o tronco está mais curto. É um estilo que une a higiene da tosa bebê no corpo com o glamour da pelagem longa nas extremidades. Apenas atente-se para a escovação das patas: como ficam mais longas, é ali que os carrapichos vão se esconder após o passeio.
Tosa Higiênica e Sua Importância Médica
A tosa higiênica não é um estilo por si só, mas a base fundamental de qualquer tosa bem-feita. Ela envolve a remoção dos pelos nas almofadas plantares (coxins), na região perianal e na barriga. Ignorar essa etapa é um erro grave. O excesso de pelo entre os dedos faz com que o cão perca aderência no piso liso, o que pode levar a problemas ortopédicos como luxação de patela, muito comum em Malteses, devido aos escorregões constantes dentro de casa.
Na região sanitária, a remoção dos pelos é vital para evitar que fezes e urina fiquem aderidas. Já tratei casos severos de miíase (bicheira) que começaram com uma pequena quantidade de fezes grudada no pelo, causando uma dermatite que atraiu moscas. Manter essa área limpa é uma questão de saúde pública e bem-estar animal. O corte na barriga também facilita a higiene dos machos, evitando que a urina molhe o pelo do abdômen.
Recomendo que a tosa higiênica seja feita mensalmente, mesmo que você não tose o corpo todo do animal. É um procedimento rápido que previne infecções e melhora a qualidade de vida do cão. Certifique-se de que o profissional use lâminas adequadas e limpas, pois a pele da barriga e da região íntima é extremamente fina e sensível a queimaduras por lâmina quente ou reações alérgicas (queimadura de tosa).
Saúde Dermatológica Relacionada à Tosa
Você precisa ter cuidado com o excesso. A pele do Maltês é rosada e, sob o manto branco, tem pouca proteção contra a radiação UV. Tosas extremas, onde a máquina passa muito baixa (como a lâmina 10 ou 40 no corpo), expõem a pele diretamente ao sol. Isso pode causar queimaduras solares graves e, a longo prazo, predispor ao câncer de pele, como o carcinoma de células escamosas. Nunca peça para “raspar no zero” a menos que haja uma indicação médica severa.
Outro ponto crítico é a famosa “lágrima ácida” ou cromodacriorreia. Embora a causa seja interna (fisiológica ou anatômica), a tosa correta na região dos olhos ajuda a mitigar os danos. Pelos entrando nos olhos causam irritação, aumentando a produção de lágrima e piorando a mancha. Um bom tosador deve saber limpar o canto medial dos olhos (o “stop”) sem deixar pontas que cutuquem a córnea. Manter essa área seca e curta é essencial para controlar a proliferação bacteriana que causa o cheiro forte e a coloração marrom.
A sensibilidade pós-tosa é uma queixa comum. Alguns Malteses desenvolvem coceira intensa após a tosa, não por alergia à lâmina, mas pela sensação estranha do ar tocando a pele ou por microtraumas. Se você notar que seu cão se coça ou arrasta o bumbum no chão após o banho e tosa, converse com seu veterinário. Podemos prescrever banhos calmantes com aveia ou produtos específicos para restaurar a barreira cutânea logo após o procedimento estético.
Manutenção Domiciliar e Ferramentas
Entre uma visita e outra ao salão, a responsabilidade é sua. E a ferramenta errada pode tornar tudo um pesadelo. Esqueça as escovas de bolinha na ponta vendidas em supermercados; elas não penetram na pelagem e apenas “alisam” a superfície, deixando os nós se formarem rente à pele. Para um Maltês, você precisa de uma escova de pinos sem bolinhas (pin brush) e uma rasqueadeira macia, além de um pente de aço para conferência.
A técnica correta é a “Line Brushing” (escovação em linhas). Você deve abrir a pelagem com a mão até ver a pele e escovar da raiz para as pontas, camada por camada. É trabalhoso, mas garante que não haja nós escondidos. O banho em casa deve ser dado com cautela. Nunca, jamais esfregue o pelo do Maltês em movimentos circulares como se estivesse lavando seu próprio cabelo. Isso cria nós impossíveis. O movimento deve ser de compressão e alisamento, sempre no sentido do crescimento do fio.
Use produtos de linha veterinária ou profissional. O pH da pele do cão é diferente do humano, e xampus de gente (mesmo os de bebê) podem agredir a barreira lipídica do animal. Hidratação é chave. Um pelo ressecado quebra e embola mais fácil. Invista em máscaras de hidratação próprias para pets a cada 15 dias. E lembre-se: se encontrar um nó difícil, não corte com a tesoura em casa. A pele do Maltês é elástica e “entra” no meio do nó. O risco de você cortar a pele do seu cão é altíssimo. Use um desembolador ou leve ao profissional.
Comparativo de Estilos e Manutenção
Para facilitar sua decisão, preparei um quadro comparativo tratando os “estilos” como produtos que você escolhe para a rotina do seu pet.
| Característica | Tosa Bebê (Puppy Cut) | Tosa Padrão (Longa/Exposição) | Tosa Asiática (Fusion Style) |
| Nível de Manutenção em Casa | Baixo. Escovação 2-3x na semana. | Altíssimo. Escovação diária e uso de papillotes. | Médio. Foco nas patas e orelhas longas. |
| Custo de Manutenção Profissional | Médio. Tosa completa a cada 45 dias. | Alto. Banhos semanais e hidratações profundas. | Médio/Alto. Requer tosador especializado em tesoura. |
| Conforto Térmico e Mobilidade | Excelente. O cão fica livre e fresco. | Baixo. O peso do pelo pode limitar movimentos e aquecer. | Bom. Corpo fresco, mas extremidades protegidas. |
| Indicação Veterinária | Cães ativos, que passeiam na rua, ou tutores com pouco tempo. | Cães de show ou tutores experientes em manejo de pelagem. | Cães de apartamento que buscam estilo e higiene facial. |
Ao escolher o estilo, você está escolhendo a rotina que terá nos próximos meses. Minha recomendação final como veterinário é: comece pelo mais simples. A Tosa Bebê ou uma Asiática bem curta no corpo garantem que a saúde da pele seja preservada e que o momento da escovação não se torne uma batalha entre você e seu cão. Um Maltês bonito é, acima de tudo, um Maltês saudável, sem nós, com a pele íntegra e feliz. Cuide da pelagem dele e você estará cuidando da saúde dele.


