O que fazer se o cachorro comer chocolate: Guia completo de sobrevivência
O que fazer se o cachorro comer chocolate: Guia completo de sobrevivência

O que fazer se o cachorro comer chocolate: Guia completo de sobrevivência

O que fazer se o cachorro comer chocolate: Guia completo de sobrevivência

Se você chegou até aqui, provavelmente está com o coração acelerado porque flagrou seu amigo de quatro patas com a boca suja de chocolate ou encontrou apenas uma embalagem vazia no chão. Respire fundo. Como veterinário, lido com essa situação frequentemente, especialmente em épocas festivas como a Páscoa ou o Natal. A primeira coisa que você precisa saber é que o pânico não ajuda, mas a agilidade salva vidas.

Neste artigo, vamos conversar de “pai para pai de pet”, mas com todo o rigor científico que a medicina veterinária exige. Vou te explicar exatamente o que acontece dentro do organismo do seu cão, como identificar a gravidade da situação e, o mais importante, o passo a passo exato do que fazer agora. Esqueça as receitas milagrosas da internet por um minuto e vamos focar em condutas médicas seguras.

Você vai sair daqui entendendo não apenas como agir na emergência, mas como prevenir que esse susto aconteça novamente. Vamos mergulhar fundo na fisiologia canina de uma forma que você nunca viu, transformando o “mediqués” em uma conversa direta e prática. A saúde do seu companheiro é nossa prioridade absoluta agora.

Por que o chocolate é tão perigoso para cães?

Muitos tutores me perguntam no consultório: “Doutor, mas eu comi um pedacinho e não aconteceu nada, por que com ele é diferente?”. A resposta está na bioquímica. O grande vilão do chocolate não é o açúcar ou a gordura, embora eles também não sejam saudáveis. O verdadeiro inimigo é uma substância chamada teobromina.[1] Enquanto o seu fígado humano é uma máquina eficiente capaz de processar e eliminar a teobromina rapidamente, o fígado do seu cachorro é muito mais lento nesse trabalho.[2]

Para você ter uma ideia, o que nós levamos poucas horas para digerir e excretar, o organismo canino pode levar dias. Durante todo esse tempo, a teobromina fica circulando no sangue do animal, agindo como um estimulante potentíssimo. Ela afeta diretamente o sistema nervoso central, o coração e os rins. É como se o seu cachorro tivesse tomado litros de café expresso de uma só vez, gerando uma sobrecarga que o corpo dele não foi projetado para suportar.

Além disso, existe a questão do tamanho e da sensibilidade individual. Um Labrador de 40 kg pode comer um bombom e não sentir quase nada, enquanto um Yorkshire de 3 kg pode entrar em estado grave com a mesma quantidade. A genética também conta; alguns cães são naturalmente mais sensíveis às metilxantinas (a família química da teobromina) do que outros. Por isso, na veterinária, tratamos toda ingestão de chocolate como uma potencial emergência até que se prove o contrário.

O vilão escondido: Entenda a Teobromina

A teobromina é uma molécula fascinante e perigosa. Ela está presente naturalmente na semente do cacau. Isso significa que quanto mais “puro” for o chocolate, mais cacau ele tem e, consequentemente, mais teobromina. É uma regra matemática simples, mas que define o risco de vida ou morte do seu animal. Ela atua inibindo receptores no cérebro que deveriam acalmar o animal e aumentando a entrada de cálcio nas células cardíacas, o que faz o coração bater mais forte e, às vezes, fora do ritmo.

Quando a teobromina entra na corrente sanguínea, ela começa a relaxar a musculatura lisa (como os brônquios) e a estimular a musculatura cardíaca e esquelética. É por isso que um dos primeiros sinais que notamos na clínica é a agitação extrema e a respiração ofegante. Não é apenas “nervosismo” por ter feito algo errado; é uma reação química incontrolável que está ocorrendo em nível celular.

Outro ponto crucial é que a teobromina tem uma “meia-vida” longa em cães. Isso significa que ela demora muito para cair pela metade da concentração no sangue. Enquanto ela estiver lá, estará sendo reabsorvida pela bexiga, criando um ciclo vicioso de intoxicação. Por isso, muitas vezes instruímos os tutores a passear com o cão para que ele urine frequentemente, ajudando a eliminar a toxina antes que ela seja reabsorvida pelo corpo.

A diferença entre nós e eles: Metabolismo canino[2][3]

O metabolismo canino é uma maravilha da natureza, adaptado para processar proteínas e gorduras de origem animal, mas falha miseravelmente com certos compostos vegetais complexos. A enzima citocromo P450, responsável por quebrar a teobromina no fígado, existe em menor quantidade ou tem menor atividade nos cães comparado aos humanos. Essa diferença evolutiva é o que torna um alimento divino para nós em um veneno para eles.

Essa lentidão metabólica faz com que os sintomas possam demorar a aparecer, mas também faz com que eles durem muito tempo. Um cão intoxicado pode ficar sintomático por até 72 horas. Imagine o sofrimento de um animal com taquicardia, náusea e tremores por três dias seguidos. É um quadro exaustivo que pode levar à falência de órgãos se não houver intervenção médica para “ajudar” o fígado a fazer o seu trabalho ou impedir a absorção inicial.

Você precisa entender que não é uma questão de “acostumar” o cachorro.[1] Não existe criar resistência à teobromina. Se você der pedacinhos de chocolate frequentemente, você não está fortalecendo o sistema dele, está apenas sobrecarregando o fígado cronicamente, o que pode levar a problemas hepáticos silenciosos ao longo do tempo, mesmo que ele não tenha uma crise aguda de intoxicação naquele momento.

Cafeína e gorduras: Os outros perigos do doce

Além da teobromina, o chocolate contém cafeína. Sim, a mesma do seu café. A cafeína potencializa os efeitos da teobromina, aumentando ainda mais a frequência cardíaca e a excitabilidade do sistema nervoso. A soma dessas duas substâncias cria uma bomba-relógio cardíaca. Em chocolates mais escuros, a concentração de cafeína também é maior, elevando o risco de arritmias que podem ser fatais.

E não podemos esquecer da gordura e do açúcar. Mesmo que o seu cão tenha a sorte de comer um chocolate com pouca teobromina (como o chocolate branco), a alta quantidade de gordura pode desencadear uma pancreatite aguda. A pancreatite é uma inflamação dolorosa e grave do pâncreas, que causa vômitos intensos, dor abdominal severa e requer internação imediata.

Muitas vezes, atendo pacientes que “se salvaram” da intoxicação por teobromina, mas voltaram dias depois com pancreatite devido à gordura da manteiga de cacau e do leite adicionado ao chocolate. Portanto, o risco é duplo: imediato (toxinas) e tardio (inflamação digestiva). Isso reforça a ideia de que nenhum chocolate é verdadeiramente seguro, mesmo aqueles que os tutores consideram “fracos”.

Identificando os sinais: Sintomas de intoxicação

Reconhecer os sinais precocemente é a chave para um prognóstico favorável. O corpo do cão começa a dar alertas assim que a absorção das toxinas atinge um nível crítico. Como veterinário, costumo dividir os sintomas em fases, o que ajuda muito a entender a gravidade do quadro quando o tutor me liga desesperado. Você precisa se tornar um observador atento do comportamento do seu pet nas próximas horas.

Muitos tutores confundem os sintomas iniciais com uma simples indigestão ou “dor de barriga”. No entanto, na intoxicação por chocolate, o quadro evolui de forma sistêmica. Não é apenas o estômago que está sofrendo; o cérebro e o coração estão sob ataque. Observar a intensidade desses sinais ajuda o veterinário a decidir qual protocolo de emergência ativar assim que vocês chegarem à clínica.

Lembre-se de que os cães tentam esconder a dor e o desconforto por instinto de sobrevivência. Se os sintomas estão visíveis, é porque o organismo já não está conseguindo compensar o desequilíbrio. Portanto, qualquer alteração comportamental após a ingestão de chocolate deve ser levada a sério imediatamente.

Sinais iniciais (nas primeiras horas)

Geralmente, entre 2 a 4 horas após a ingestão, os primeiros sinais gastrointestinais aparecem. O vômito é o mais comum, muitas vezes com cheiro característico de chocolate. A diarreia também pode ocorrer, e o animal pode apresentar uma sede excessiva (polidipsia). Você vai notar que ele bebe água desesperadamente e, consequentemente, urina muito mais do que o normal.

Outro sinal clássico dessa fase inicial é a inquietação. O cachorro não consegue encontrar uma posição confortável para deitar. Ele senta, levanta, anda pela casa, parece ansioso. Isso é o efeito estimulante da teobromina começando a agir no cérebro. Ele pode também ficar ofegante, mesmo estando em repouso ou em um ambiente fresco, o que indica que o sistema cardiovascular já está trabalhando mais rápido do que deveria.

Nesta fase, o abdômen pode ficar distendido e dolorido ao toque. Se você colocar a mão na barriga dele, pode sentir uma tensão ou ele pode rosnar/chorar. Identificar a intoxicação neste estágio é o cenário ideal, pois muitas vezes ainda há tempo para impedir que a maior parte da toxina seja absorvida ou cause danos permanentes aos órgãos vitais.

Sintomas avançados e graves

Se a quantidade ingerida foi alta ou se o tempo passou sem tratamento, os sintomas neurológicos e cardíacos começam a dominar o quadro. A hiperatividade se transforma em tremores musculares visíveis. Você pode notar as patas tremendo sozinhas ou o corpo todo rígido. A coordenação motora falha, e o animal pode tropeçar ou parecer bêbado (ataxia).

Em casos severos, esses tremores evoluem para convulsões. As convulsões por intoxicação são assustadoras e perigosas, pois elevam a temperatura corporal a níveis que podem “cozinhar” as células cerebrais (hipertermia maligna). O coração, nessa fase, pode estar batendo de forma descompassada (arritmia), o que compromete a circulação de sangue e oxigênio para o corpo.

Outro sinal grave é a cianose, quando a língua e as gengivas ficam arroxeadas ou azuladas devido à má oxigenação. O colapso e o coma são os estágios finais antes do óbito por parada cardiorrespiratória. É doloroso descrever isso, mas você precisa saber a gravidade para entender por que insistimos tanto na ida imediata ao veterinário, mesmo que o cão pareça “bem” no início.

O fator tempo: Quando os sintomas aparecem?

A cronologia da intoxicação é variável, mas geralmente segue um padrão. Os sintomas raramente são imediatos como em um engasgo. Eles costumam aparecer entre 6 a 12 horas após a ingestão, mas podem surgir tão cedo quanto 1 hora se o estômago estava vazio e o chocolate era muito concentrado. O pico da concentração de teobromina no sangue ocorre por volta de 10 horas após a ingestão.

O perigo dessa “janela de silêncio” é que o tutor pode achar que o perigo passou. “Ah, ele comeu de manhã e agora à tarde está bem, então não fez mal”. Esse é um erro fatal. Quando os sintomas aparecem, significa que a toxina já foi absorvida. O objetivo do tratamento veterinário ideal é agir antes dos sintomas aparecerem, durante essa janela de tempo em que o chocolate ainda está no estômago ou recém-entrando no intestino.

Além disso, como a teobromina demora para ser eliminada, os sintomas podem persistir por dias. A recuperação é lenta e exige monitoramento. Portanto, o tempo não joga a seu favor nessa situação. Quanto mais rápido você agir, menos tempo a toxina terá para se ligar aos receptores do coração e do cérebro do seu cachorro.

Passo a passo imediato: O cachorro comeu chocolate, e agora?

A descoberta do crime culinário aconteceu. O que você faz nos próximos 5 minutos determina muito do sucesso do tratamento. A primeira regra é manter a calma para pensar com clareza. Você precisa virar um investigador forense rapidamente. Olhe ao redor, encontre as pistas e prepare-se para se comunicar com o profissional de saúde do seu pet.

Não perca tempo brigando com o cachorro ou tentando descobrir quem deixou o chocolate ao alcance dele. Isso pode ser resolvido depois. Agora, o foco é a descontaminação. Se você pegou ele no flagra, com o chocolate ainda na boca, retire gentilmente, mas com firmeza. Se já foi engolido, passamos para a fase de mitigação de danos e coleta de informações vitais.

Esteja preparado para se deslocar. Mesmo que seja madrugada, procure um hospital veterinário 24 horas. Intoxicação não espera o dia amanhecer. Tenha sempre o número de emergência salvo no seu celular; na hora do pânico, procurar no Google pode custar minutos preciosos. Vamos organizar suas ações agora.

Avalie a situação: Tipo e quantidade

Esta é a informação mais valiosa que você vai entregar ao veterinário. Tente determinar exatamente o que ele comeu e quanto. Guarde a embalagem! A embalagem diz a porcentagem de cacau (ex: 70%, ao leite, branco). Se você não sabe a quantidade exata, estime pelo que sobrou. “Ele comeu meia barra de 150g” é uma informação muito mais útil do que “ele comeu um pouco”.

Pese o seu cachorro se possível, ou tenha uma estimativa recente do peso dele. A toxicidade é uma conta matemática: miligramas de teobromina por quilograma de peso do animal. Um cão de 30kg comendo 50g de chocolate ao leite tem um risco baixo. O mesmo cão comendo 50g de chocolate amargo 80% cacau corre risco de vida.

Se foi um bolo ou biscoito, tente lembrar a receita ou ler o rótulo. Produtos que contêm cacau em pó são extremamente perigosos, pois o pó é uma forma concentrada. Anote tudo isso ou tire fotos das embalagens e dos vômitos (se houver) para mostrar ao veterinário. Esses detalhes guiam a agressividade do tratamento necessário.

O que NÃO fazer em casa (Cuidado com receitas caseiras)

A internet está cheia de dicas perigosas, como “dê água oxigenada”, “dê sal”, “dê leite” ou “azeite”. Como veterinário, peço encarecidamente: não faça isso sem orientação direta. Induzir o vômito com água oxigenada (peróxido de hidrogênio) pode causar úlceras gástricas severas, esofagite e até pneumonia aspirativa se o animal inalar a espuma. O sal em excesso pode causar intoxicação por sódio, causando inchaço cerebral fatal.

Dar leite é outro erro comum. O leite não corta o efeito do veneno e a gordura do leite pode na verdade aumentar a absorção de componentes lipossolúveis do chocolate, além de piorar a diarreia. Azeite ou óleo apenas lubrificam o trato gastrointestinal, podendo acelerar a passagem do veneno para o intestino, onde ele é absorvido mais rápido.

A única situação em que induzimos vômito em casa é sob orientação estrita de um veterinário por telefone, que avaliou que o tempo de deslocamento até a clínica é muito longo e o risco da ingestão é maior que o risco do procedimento. Caso contrário, deixe a indução do vômito para o ambiente controlado da clínica, onde podemos proteger as vias aéreas do animal.

A hora de correr para o veterinário

Não espere “para ver se ele melhora”. Se você suspeita que a quantidade ingerida foi tóxica (baseado no peso e tipo), vá imediatamente. Se o seu cão já apresenta qualquer sintoma (vômito, tremores, agitação), isso é uma emergência vermelha. Não marque consulta, vá direto ao pronto-socorro.

No caminho, ligue para a clínica avisando que está chegando com um caso de intoxicação por chocolate. Isso permite que a equipe prepare a sala de emergência, separe as medicações anticonvulsivantes e o material para lavagem gástrica. Mantenha o carro ventilado e tente manter o animal calmo. Se ele estiver tendo tremores ou convulsões, não tente segurar a língua dele; apenas proteja a cabeça dele de impactos.

Lembre-se: é melhor pecar pelo excesso de zelo. Já atendi tutores que trouxeram o cão que comeu apenas um brigadeiro e voltaram para casa felizes apenas com um susto, e já atendi cães que chegaram tarde demais porque o tutor achou que não seria nada. A prevenção e a ação rápida são sempre o melhor caminho.

Tratamentos e Procedimentos Veterinários

Ao chegar na clínica, você entrega o paciente e nós assumimos o controle. Mas o que acontece lá dentro? Entender os procedimentos diminui sua ansiedade. Nosso objetivo principal é triplo: impedir a absorção (se for recente), acelerar a eliminação e controlar os sintomas que ameaçam a vida.

A medicina veterinária avançou muito e hoje temos protocolos muito seguros. Não existe um “antídoto” mágico para a teobromina, uma injeção que corta o efeito instantaneamente. O tratamento é de suporte e descontaminação. É uma batalha de horas ou dias para limpar o sangue do seu amigo.

Cada caso é único. Um cão que chega 30 minutos após a ingestão recebe um tratamento totalmente diferente daquele que chega 6 horas depois. Por isso a importância do histórico que você nos fornece. Confie na equipe médica; estamos lutando com as melhores armas disponíveis pela vida do seu pet.

Descontaminação gástrica: Carvão ativado e lavagem

Se a ingestão ocorreu há menos de duas horas, a indução de vômito (êmese) é geralmente o primeiro passo, feita com medicações injetáveis seguras. Se a quantidade foi muito grande ou se o vômito não for suficiente, podemos optar pela lavagem gástrica. O animal é sedado, entubado (para proteger os pulmões) e passamos uma sonda até o estômago para “lavar” o conteúdo tóxico.

O grande herói do tratamento é o carvão ativado. Ele é administrado por via oral e age como um ímã, adsorvendo (grudando) as toxinas no estômago e intestino, impedindo que elas passem para o sangue. Como a teobromina recircula no corpo, muitas vezes administramos carvão ativado repetidamente a cada 4 ou 6 horas para continuar capturando a toxina que o corpo tenta reabsorver.

Esse procedimento pode fazer uma sujeira danada e as fezes do seu cão sairão pretas por alguns dias, mas é extremamente eficaz. O carvão ativado é o padrão ouro na toxicologia veterinária e salva inúmeras vidas quando administrado a tempo.

Tratamento de suporte e fluidoterapia

Colocar o animal no soro (fluidoterapia intravenosa) é essencial. O objetivo é manter o animal hidratado (pois ele perde líquidos no vômito e diarreia) e, principalmente, forçar a diurese. Queremos que os rins filtrem o sangue o mais rápido possível e eliminem a teobromina na urina. Quanto mais xixi ele fizer, mais rápido a toxina vai embora.

Além disso, o soro ajuda a manter a pressão arterial estável e protege os rins de lesões agudas. Em alguns casos, precisamos colocar uma sonda uretral para garantir que a bexiga esteja sendo esvaziada continuamente, pois a teobromina na urina parada na bexiga pode ser reabsorvida pela parede vesical, voltando para o sangue.

Também administramos protetores gástricos e medicações para enjoo, garantindo que o animal tenha o mínimo de conforto e não sofra com gastrites ou úlceras causadas pela irritação do chocolate e do próprio tratamento.

Monitoramento cardíaco e controle de convulsões

Para os casos graves, a internação em UTI é necessária para monitoramento cardíaco contínuo (ECG). Arritmias cardíacas são uma causa comum de morte por intoxicação de chocolate. Se o coração começar a bater fora do ritmo, usamos medicações antiarrítmicas específicas (como lidocaína ou beta-bloqueadores) para estabilizar os batimentos.

Se o animal apresentar tremores severos ou convulsões, usamos sedativos e anticonvulsivantes (como diazepam ou fenobarbital) para “desligar” esse excesso de eletricidade cerebral e evitar danos neurológicos permanentes. O controle da temperatura também é vital, pois a atividade muscular intensa gera muito calor.

O animal só recebe alta quando os níveis de teobromina baixam, o coração está estável, ele consegue se alimentar sem vomitar e não apresenta mais sinais neurológicos. Isso pode levar de 24 a 72 horas de internação intensiva.

Classificação de Risco: Tipos de Chocolate e Toxicidade

Para te ajudar a visualizar o perigo, criei este comparativo. Pense nesses três tipos de chocolate como “produtos” com níveis de periculosidade completamente diferentes. A quantidade de teobromina é medida em miligramas por grama de chocolate (mg/g).

Tipo de Chocolate (O “Produto”)Teobromina (aprox.)Nível de RiscoComparação Prática
Chocolate Branco~0.009 mg/gBaixoO risco toxicológico é mínimo, mas o risco de pancreatite pela gordura é alto. É um “falso amigo”.
Chocolate ao Leite~1.5 – 2.0 mg/gModeradoO perigo comum. Uma barra média pode intoxicar seriamente um cão pequeno. Requer atenção total.
Chocolate Amargo / Em Pó~5.0 – 15.0 mg/gAltíssimoO “veneno” puro. Pequenas quantidades (como uma mordida em uma barra 70%) podem ser fatais. Emergência absoluta.

Chocolate Branco: Menor risco, mas não inofensivo

Muitos acham que, por ter pouca teobromina, o chocolate branco é “liberado”. Errado. Ele é feito basicamente de manteiga de cacau, açúcar e leite. Embora dificilmente cause a intoxicação neurológica clássica, ele é uma bomba de gordura.

Cães que ingerem chocolate branco frequentemente desenvolvem vômitos e diarreias intensas. O perigo real aqui é a pancreatite, que pode ser tão letal quanto a intoxicação por teobromina, mas age de forma diferente. Portanto, não subestime o chocolate branco; ele ainda exige contato com o veterinário.

Chocolate ao Leite: O perigo moderado comum

Este é o campeão das intoxicações, simplesmente porque é o mais comum em nossas casas. Ovos de Páscoa, bombons e barras de supermercado geralmente são deste tipo. O risco aqui é traiçoeiro porque varia muito com a marca e a qualidade. Chocolates ao leite mais “gourmet” tendem a ter mais cacau e, portanto, serem mais tóxicos.

Para um cão de porte médio, comer um bombom pode não causar nada além de um piriri. Mas para um Pinscher ou Yorkshire, esse mesmo bombom pode causar taquicardia e tremores. Nunca assuma que “é só chocolate ao leite”. Faça as contas com seu veterinário.

Chocolate Amargo e em Pó: Risco gravíssimo

Aqui mora o perigo real. O chocolate culinário (aquele usado para fazer bolos), o chocolate em pó (cacau puro) e as barras “Dark” (70%, 80%, 99%) são extremamente concentrados. A ingestão de apenas algumas gramas de cacau em pó pode matar um cão de médio porte.

Se o seu cachorro comeu chocolate amargo ou lambeu cacau em pó que caiu no chão, não espere sintomas. Corra para o hospital. A concentração de metilxantinas é tão alta que o tempo de reação para salvar o animal é muito curto. Trate isso como se ele tivesse ingerido veneno de rato ou outra substância letal.

Prevenção e Convivência: Mantendo o Pet Seguro

Depois do susto, vem a lição. A melhor forma de tratar a intoxicação por chocolate é garantir que ela nunca aconteça. Cães são oportunistas e têm um olfato incrível. Eles sabem onde você guardou aquele ovo de Páscoa, mesmo que esteja embrulhado em papel alumínio e dentro de uma caixa.

A prevenção exige uma mudança de hábitos da casa, não apenas “esconder melhor”. Envolve educar todos que convivem com o animal. Muitas vezes, o culpado não é o tutor principal, mas uma visita desavisada ou uma criança que quis dividir o lanche com o “amiguinho”.

Vamos blindar sua casa contra esse acidente. Pequenas mudanças na rotina e na organização do ambiente podem salvar você de uma conta alta no veterinário e, principalmente, salvar a vida do seu melhor amigo.

Onde guardar os doces: “À prova de focinho”

Esqueça o “deixar em cima da mesa”. Cães maiores alcançam, e cães menores são criativos – eles pulam em cadeiras para chegar ao topo. Armários altos e fechados são os únicos locais seguros. Se o armário for baixo, use travas de segurança para crianças; muitos cães aprendem a abrir portas com o focinho ou as patas.

Cuidado extra com bolsas e mochilas. É muito comum o cão fuçar a bolsa da visita que largou no sofá e encontrar uma barra de cereal com chocolate ou um bombom esquecido. Crie o hábito de pendurar bolsas em ganchos altos assim que entrar em casa.

Na Páscoa e Natal, a atenção deve ser redobrada. Não coloque chocolates embaixo da árvore de Natal se você tem pets. O cheiro é irresistível e o papel de presente brilhante parece um brinquedo.

Educando a família e visitas (principalmente na Páscoa)

Tenha uma conversa franca com todos na casa. Explique que “só um pedacinho” pode matar. Mostre a gravidade. Muitas pessoas, especialmente as mais velhas que tiveram cães “na roça” antigamente, podem achar que é exagero. Explique que o chocolate de hoje e os cães de dentro de casa são diferentes.

Ensine as crianças que amar o cachorro significa proteger a saúde dele, e não dar doces. Se receber visitas, avise educadamente: “Por favor, não deem nada de comer para o cachorro, ele tem uma dieta restrita”. Isso corta a possibilidade de acidentes por “bondade”.

Alternativas seguras: Petiscos que parecem “doces”

Você não precisa privar seu cão de mimos. Existem no mercado “chocolates para cães”. Eles são feitos de alfarroba, uma vagem doce que tem sabor parecido com chocolate e cacau, mas não contém teobromina nem cafeína. É 100% seguro.

Frutas como banana, maçã (sem sementes) e cenoura também são ótimos petiscos naturais que satisfazem a vontade de comer algo diferente. Se você quer agradar seu pet enquanto come seu chocolate, dê a ele um petisco apropriado. Assim, vocês dois aproveitam o momento sem riscos. Lembre-se: o amor que você sente pelo seu pet deve ser demonstrado através do cuidado e da responsabilidade. Mantenha o chocolate longe e a saúde dele perto.

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