Guia Definitivo do Veterinário: Como Viajar de Avião com Seu Cachorro (Nacional e Internacional)
Se você já sentiu um frio na barriga só de pensar em colocar seu cachorro em um avião, saiba que não está sozinho. No meu consultório, essa é uma das dúvidas que mais geram ansiedade nos tutores. E com razão: o ambiente aeroportuário é barulhento, as regras são rígidas e a segurança do nosso melhor amigo é inegociável. Mas, acredite, com o preparo certo, voar pode ser uma experiência segura e gerenciável.
Viajar com pets deixou de ser um “bicho de sete cabeças”, mas exige que você assuma o papel de um verdadeiro gerente de logística. Não se trata apenas de comprar uma passagem; envolve saúde, burocracia e, acima de tudo, o bem-estar físico e mental do animal. Como veterinário, vejo muitos erros que poderiam ser evitados com informação correta e antecedência.
Neste guia, vou te conduzir por todo o processo, desde a primeira vacina até o momento de pisar em terra firme no destino. Vamos deixar de lado o “juridiquês” das companhias aéreas e focar no que realmente importa na prática: como garantir que seu cão chegue bem, saudável e abanando o rabo do outro lado.
O Planejamento Começa no Consultório (Documentação)
A primeira coisa que você precisa entender é que o “passaporte” do seu cachorro é a saúde dele. Sem os documentos sanitários em dia, nem a caixa de transporte mais cara do mundo fará seu pet embarcar. O planejamento deve começar, idealmente, três a quatro meses antes da viagem, especialmente se o destino for internacional.
Para viagens nacionais, a burocracia é mais leve, mas não inexistente. O atestado de saúde simples é a regra de ouro, mas ele tem prazo de validade curto. Muitos tutores perdem o voo porque emitem o atestado com muita antecedência e ele vence antes do embarque. Fique atento aos prazos e alinhe isso com a agenda do seu veterinário de confiança.
Carteira de Vacinação: O Básico que Reprova[1]
A vacina antirrábica é o pilar da viagem aérea. Para voos nacionais e internacionais, ela precisa ter sido aplicada há mais de 30 dias e há menos de um ano. Se você vacinou seu cão ontem, ele não voa hoje. Esse período de 30 dias é o tempo que o sistema imunológico leva para criar os anticorpos necessários, e as autoridades sanitárias não abrem exceções.
Além da raiva, recomendo fortemente que as vacinas V8 ou V10 (múltiplas) estejam em dia. Embora nem sempre sejam exigidas legalmente para o embarque doméstico, elas protegem seu cão em um ambiente de alto fluxo como um aeroporto, onde circulam animais de todas as origens. Lembre-se de verificar se as etiquetas das vacinas contêm a data, o carimbo e a assinatura do veterinário responsável.
Não esqueça da desparasitação interna e externa.[2] O controle de pulgas, carrapatos e vermes deve ser realizado dias antes da viagem. Para destinos internacionais, a data exata da aplicação do vermífugo é crucial e deve constar no atestado de saúde com o princípio ativo e a dosagem utilizada.
CVI (Certificado Veterinário Internacional) e a Burocracia[3]
Se o seu destino é fora do Brasil, você precisará do CVI (Certificado Veterinário Internacional).[2][4] Esse documento é emitido pelo Vigiagro (órgão do Ministério da Agricultura) e comprova que seu cão cumpre as exigências sanitárias do país de destino. Atualmente, para muitos países, o processo é digital via portal Gov.br, o que facilitou a vida, mas não eliminou a necessidade de atenção aos detalhes.
O CVI tem validade curta, geralmente de 5 a 10 dias para o embarque, dependendo do país. Isso cria uma janela de tempo apertada: você precisa levar o cão ao veterinário para obter o atestado de saúde (modelo específico do CVI) e, em seguida, submeter a documentação ao governo. Qualquer erro de digitação no nome do tutor ou na data da vacina pode fazer o processo voltar para a estaca zero.
Para a Europa e alguns outros destinos, a exigência da sorologia de raiva é um ponto crítico. Esse exame precisa ser feito com 90 dias de antecedência da viagem. Ou seja, se você decidiu ir para Portugal semana que vem e seu cão não tem sorologia, infelizmente ele não poderá ir. O planejamento de longo prazo é essencial aqui.
Microchipagem e Laudos Específicos
A identificação eletrônica é obrigatória para quase todas as viagens internacionais e altamente recomendada para as nacionais. O microchip deve ser implantado antes ou no mesmo dia da vacina antirrábica, nunca depois. Isso serve para garantir que a vacina foi dada naquele animal especificamente identificado.
Alguns destinos exigem laudos adicionais. Países livres de certas doenças podem pedir tratamentos específicos contra parasitas que não temos ou que são endêmicos aqui. Sempre verifique as regras no site da embaixada ou consulado do país de destino, pois elas mudam com frequência.
Tenha em mãos cópias físicas de tudo. A tecnologia ajuda, mas se o sistema cair no aeroporto ou se a bateria do celular acabar, o papel é sua garantia. Organize tudo em uma pasta impermeável e leve-a na sua bagagem de mão, de fácil acesso.
Escolhendo o Lugar do Pet: Cabine ou Porão?
Essa é a decisão que mais tira o sono dos tutores. A regra geral é baseada no peso e tamanho: cães pequenos vão na cabine com você; cães médios e grandes vão no compartimento de carga (porão). No entanto, cada companhia aérea tem suas próprias limitações de peso, que variam geralmente entre 7kg e 10kg somando o peso do cão mais a caixa.
Regras de Ouro para Voar na Cabine
Viajar na cabine é, sem dúvida, menos estressante para o tutor, pois o pet está ao alcance dos olhos. Mas para o cão, também exige preparo. Ele deverá permanecer dentro da bolsa de transporte (flexível ou rígida) durante todo o voo, alojado embaixo do assento à sua frente. Ele não pode sair para “dar uma voltinha” no corredor, nem colocar a cabeça para fora.
Você deve garantir que a bolsa tenha as medidas exatas exigidas pela companhia aérea. Se a bolsa for muito alta, não caberá sob o assento; se for muito pequena, o funcionário do check-in pode negar o embarque se perceber que o animal está desconfortável ou apertado. O cão precisa conseguir ficar de pé e dar uma volta sobre o próprio eixo dentro da mala.
O cheiro é outro fator importante. Dê um banho no animal um ou dois dias antes, mas evite perfumes fortes que possam enjoá-lo ou incomodar outros passageiros. Forre a bolsa com tapetes higiênicos de alta absorção, pois acidentes acontecem e você precisa estar preparado para trocar o forro discretamente no banheiro da aeronave, se necessário.
A Realidade do Compartimento de Carga (Porão)
O porão do avião não é um lugar escuro e sem ar como muitos imaginam. A área onde os animais viajam (chamada de bulk) é pressurizada, iluminada e tem controle de temperatura, assim como a cabine lá em cima. O maior desafio no porão não é a falta de ar, mas sim o barulho e a solidão.
O ruído das turbinas e da operação de bagagens pode assustar animais que não estão acostumados a barulhos altos. Por isso, a adaptação à caixa de transporte (que falaremos adiante) é vital. Se a caixa for um refúgio seguro para ele, o estresse diminui drasticamente.
Recentemente, houve suspensões de serviços de transporte no porão por algumas companhias aéreas nacionais devido a incidentes tristes. Verifique sempre a situação atual da companhia escolhida. Hoje, a segurança é reforçada, e os protocolos de “Live Animals” exigem que o comandante seja notificado de que há carga viva a bordo, para que ele monitore a temperatura do compartimento com rigor.
O Dilema dos Focinhos Curtos (Braquicefálicos)
Cães de focinho achatado, como Pugs, Buldogues Franceses e Shih Tzus, exigem atenção redobrada. A anatomia deles dificulta a troca de calor e a respiração, especialmente em situações de estresse ou calor. Por isso, muitas companhias aéreas proíbem terminantemente o transporte dessas raças no porão.
Se seu cão é braquicefálico e excede o peso para ir na cabine, suas opções de voo comercial são limitadas. Você pode precisar buscar serviços especializados de táxi aéreo ou transporte terrestre. O risco de hipertermia e insuficiência respiratória é real, e como veterinário, apoio as restrições que visam proteger a vida desses animais.
Caso seu braquicefálico caiba na cabine, foque em mantê-lo calmo e fresco. Leve um ventilador portátil pequeno e ofereça água (cubos de gelo são ótimos) para ajudar na termorregulação durante o voo.
A Caixa de Transporte Ideal (O “Bunker” de Segurança)
Para o transporte no porão, a caixa de transporte (kennel) não é apenas uma mala; é o dispositivo de segurança que protege a vida do seu cão. Ela precisa seguir o padrão IATA (Associação Internacional de Transportes Aéreos). Esqueça as caixinhas bonitinhas de passeio; aqui precisamos de robustez.
Entendendo o Padrão IATA na Prática
A caixa deve ser de plástico rígido e resistente, ou madeira reforçada (para cães muito grandes ou raças fortes). Ela deve ter ventilação em pelo menos três lados (quatro para voos internacionais). O trinco da porta deve ser impossível de ser aberto pelo animal por dentro, mas fácil de ser operado pelos funcionários por fora.
O tamanho é o critério número um de reprovação no check-in. A regra é clara: o cão deve ficar de pé sem encostar a cabeça no teto, deve conseguir girar 360 graus lá dentro e deitar-se confortavelmente. Se as orelhas do seu Pastor Alemão tocam o teto, você precisará de uma caixa maior. Não tente economizar espaço aqui; as companhias medem e barram sem dó.
O Treino de Adaptação é Inegociável
Compre a caixa pelo menos dois meses antes da viagem. Deixe-a na sala de casa, aberta, e transforme-a no lugar mais legal do mundo. Coloque petiscos, brinquedos e faça o cão dormir lá dentro espontaneamente. O objetivo é que, no dia da viagem, ao ver a caixa, ele pense “que bom, meu quarto seguro”, e não “socorro, uma prisão”.
Associe a caixa a momentos positivos. Alimente o cão dentro dela. Feche a porta por alguns segundos, depois por minutos, aumentando o tempo gradualmente. Se o seu cão destrói a caixa ou uiva desesperadamente ao ser fechado, ele não está pronto para voar no porão. Isso não é apenas sobre conforto, é sobre evitar que ele se fira tentando escapar durante o voo.
Detalhes que Salvam: Parafusos, Tapetes e Água
Caixas IATA exigem parafusos de metal unindo a parte de cima e a de baixo. Travas de plástico (“clic”) podem se soltar com vibração ou impacto. Se sua caixa tem travas de plástico, reforce com cintas ou troque os parafusos. Rodinhas são proibidas; se a caixa tiver, elas devem ser removidas ou travadas no momento do embarque.
O fundo da caixa deve ser forrado com material absorvente, como tapetes higiênicos ou jornais picados. Nunca coloque cobertores grossos soltos que possam enrolar no animal. Fixe um bebedouro e um comedouro na porta da grade, acessíveis por fora (para que os funcionários possam colocar água sem abrir a porta, se houver atraso no voo).
Saúde e Fisiologia em Altitude (Expansão)
Voar altera a fisiologia. A pressão atmosférica na cabine, embora controlada, é equivalente a estar no topo de uma montanha média. Isso tem efeitos no organismo do animal, e entender isso muda como preparamos o pet.
Por que Não Sedamos Animais para Voar?
Esta é a regra mais importante da medicina veterinária de voo: não sede seu animal sem indicação comportamental estrita e supervisão. Sedativos comuns, como a acepromazina, causam hipotensão (queda de pressão) e relaxamento muscular excessivo. Em altitude, isso pode reduzir a capacidade do animal de regular sua temperatura e manter o equilíbrio postural.
Se houver turbulência e o animal estiver dopado, ele não consegue se firmar na caixa, podendo se machucar batendo nas paredes. Além disso, a depressão respiratória causada por sedativos, somada à menor oxigenação da altitude, pode ser fatal.
Se o seu cão é muito ansioso, converse com seu veterinário sobre ansiolíticos modernos (como gabapentina ou trazodona) que reduzem o medo sem “apagar” o animal. O objetivo é que ele fique calmo, mas consciente e capaz de responder a estímulos.
O Jejum Estratégico e o Enjoo
O enjoo por movimento (cinetose) é comum. Recomendo um jejum de alimentos sólidos de 6 a 8 horas antes do voo. Isso reduz drasticamente o risco de vômito. Se o cão vomitar na caixa e estiver sozinho no porão, ele pode aspirar o conteúdo gástrico, o que leva a pneumonias graves.
A água, porém, deve ser oferecida até o momento do embarque e, se possível, durante a viagem (cubos de gelo no bebedouro são ótimos porque derretem devagar e não molham a caixa toda no balanço da decolagem). Hidratação é fundamental para manter a circulação sanguínea eficiente.
Pressurização e Ouvidos: Como Aliviar?
Assim como nós sentimos o ouvido “estalar” na decolagem e no pouso, os cães também sentem. Isso pode causar desconforto e dor. Se o cão estiver na cabine com você, oferecer um petisco duro ou um brinquedo de roer durante a subida e a descida estimula o movimento da mandíbula, o que ajuda a equalizar a pressão nos ouvidos.
Para cães no porão, não há muito o que fazer nesse momento específico, mas garantir que as vias aéreas estejam desobstruídas (sem gripes ou rinites) antes da viagem ajuda a minimizar essa dor. Uma consulta pré-viagem serve também para checar isso.
O Dia da Viagem: Do Check-in ao Desembarque
O grande dia chegou. Chegue ao aeroporto com muita antecedência — 3 a 4 horas para voos internacionais. O processo de check-in de animal vivo é manual, lento e burocrático.
Check-in e a Pesagem Tensa
No balcão, a equipe vai pesar o conjunto (cão + caixa), medir as dimensões e conferir a papelada. Mantenha a calma. Se você seguiu as regras, não há o que temer. Se o cão estiver agitado, leve-o para uma caminhada longa antes de entrar no terminal para gastar energia.
Verifique se a etiqueta de identificação com seus dados (nome, telefone, voo, destino) está firme na caixa e também na coleira do cão. Eu recomendo escrever com caneta permanente direto na carcaça da caixa de transporte também.
Passando pelo Raio-X com Segurança
Este é um momento crítico. A caixa de transporte deve passar pelo raio-X vazia. Isso significa que você terá que tirar o cachorro da caixa no meio do saguão movimentado.
Jamais tire o cão da caixa sem coleira e guia. O barulho e a confusão podem fazer o cão mais calmo do mundo tentar fugir. Coloque a guia, tire-o da caixa, passe pelo pórtico detector de metais com ele no colo ou andando ao seu lado, enquanto a caixa passa na esteira. Só o coloque de volta quando a caixa estiver liberada e segura.
O Comportamento a Bordo
Se o pet estiver na cabine, a regra é o silêncio. Se ele começar a latir ou chorar, não o tire da bolsa (é proibido). Tente acalmá-lo com sua voz baixa e toque pela tela da bolsa. Abrir o zíper “só um pouquinho” é um erro que pode permitir uma fuga para o corredor da aeronave, gerando um incidente de segurança grave.
Pós-Voo: Protocolo de Recuperação (Expansão)
Pousaram! A missão ainda não acabou. O período pós-voo exige observação atenta para garantir que o organismo do seu cão volte ao normal.
Avaliação Física Imediata no Desembarque
Assim que pegar o cão (seja na esteira de bagagens especiais ou saindo do avião), verifique a cor das gengivas dele. Devem estar rosadas. Se estiverem muito pálidas ou arroxeadas, procure ajuda veterinária imediatamente. Verifique se ele não tem ferimentos nas patas ou focinho, causados por tentar sair da caixa.
Hidratação e “Xixi” de Alívio
A prioridade número um é levar o cão para uma área onde ele possa urinar. Ele provavelmente segurou as necessidades por horas. O alívio da bexiga reduz a ansiedade instantaneamente.
Ofereça água fresca em pequenas quantidades, mas várias vezes. Evite dar um pote gigante de comida imediatamente; o estômago pode estar sensível. Espere uma ou duas horas para oferecer a refeição normal.
Monitorando Sinais de Estresse Tardio
Nos dias seguintes, observe o comportamento. É normal que ele durma mais que o habitual (o famoso jet lag canino). Porém, fique atento a diarreias, vômitos ou recusa alimentar por mais de 24 horas. Mudanças climáticas bruscas também podem baixar a imunidade, então mantenha-o aquecido e confortável.
Quadro Comparativo: As Principais Aéreas Brasileiras
Abaixo, preparei um comparativo focado no “produto” que é o serviço de transporte aéreo das três maiores companhias do Brasil. Lembre-se: regras e preços mudam, confira sempre no site oficial antes de comprar.
| Característica | LATAM | GOL | AZUL |
| Pet na Cabine | Até 7 kg (animal + caixa). Bolsa flexível ou rígida. | Até 10 kg (animal + caixa). Bolsa flexível preferencialmente. | Até 10 kg (animal + caixa). Bolsa flexível preferencialmente. |
| Pet no Porão | Aceita animais grandes (até 45kg ou mais, dependendo da aeronave). | Serviço suspenso temporariamente (verificar status atual). | Não transporta animais no porão (apenas cabine). |
| Custo Médio (Doméstico) | R 200−R 200 - R200−R 300 por trecho (Cabine). Variável por peso no Porão. | R 250−R 250 - R250−R 350 por trecho (Cabine). | Aprox. R 250−R 250 - R250−R 300 por trecho (Cabine). |
| Restrições Importantes | Muito rigorosa com as medidas da caixa na cabine (altura máx 19cm rígida / 23cm flexível). | A suspensão do serviço de porão limitou muito as opções para cães médios/grandes. | Ótima para cães pequenos (até 10kg), mas inviável para qualquer cão acima desse peso. |
Viajar com seu cachorro é um desafio logístico, mas a recompensa de ter seu companheiro ao seu lado nas férias ou na nova casa não tem preço. Prepare-se, visite seu veterinário, siga as regras e boa viagem! Você e seu pet vão tirar isso de letra.
Sources help
- diariodopara.com.br
- youtube.com
- google.com
- www.gov.br
- youtube.com
- www.gov.br
- tiendanimal.pt
- petworktravel.com.br
- cargavivaexport.com.br
- kennels.com.br
- cnnbrasil.com.br
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