Como tirar passaporte para cães: Guia completo do Médico Veterinário
Como tirar passaporte para cães: Guia completo do Médico Veterinário

Como tirar passaporte para cães: Guia completo do Médico Veterinário

Como tirar passaporte para cães: Guia completo do Médico Veterinário


Como tirar passaporte para cães: Guia completo do Médico Veterinário

Viajar com nossos animais de estimação deixou de ser um luxo e se tornou uma necessidade para muitas famílias multiespécie. Você provavelmente já se pegou sonhando com aquela foto do seu cachorro correndo em um parque europeu ou passeando pelas ruas de Buenos Aires. Como médico veterinário, vejo essa vontade crescer diariamente no meu consultório. No entanto, o sonho pode virar um pesadelo burocrático se não houver um planejamento sanitário rigoroso.

O processo de retirada do passaporte ou a emissão dos documentos de viagem exige atenção aos detalhes e um conhecimento profundo sobre a saúde do seu animal. Não se trata apenas de carimbar um papel. Estamos falando de garantir que o seu melhor amigo não transporte doenças entre fronteiras e que ele tenha condições físicas de suportar horas de voo ou estrada. A saúde pública internacional depende dessas regras rígidas que muitas vezes parecem exageradas para quem vê de fora.

Neste guia, vou conversar com você como converso com os tutores na sala de atendimento. Vamos deixar de lado o “juridiquês” das normativas e focar no que você realmente precisa fazer. Prepare a carteira de vacinação, respire fundo e vamos desmistificar o trânsito internacional de cães. O objetivo é que você termine esta leitura sabendo exatamente qual o próximo passo para garantir o embarque do seu pet com total segurança e legalidade.

Entendendo o Passaporte para Trânsito de Cães e Gatos

Muita gente confunde o Passaporte para Trânsito de Cães e Gatos com o Certificado Veterinário Internacional, conhecido como CVI. Você precisa entender que o passaporte brasileiro é um documento oficial, emitido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Ele tem a aparência de um passaporte humano, com capa azul e foto do animal. A grande vantagem dele é que ele vale por toda a vida do animal para identificação e serve para registrar o histórico sanitário. Porém, a “validade para viagem” depende da atualização das vacinas e da validação veterinária a cada nova jornada.

Já o CVI é um documento emitido especificamente para uma viagem única. Se você vai viajar apenas uma vez para os Estados Unidos, por exemplo, talvez o CVI seja mais prático e rápido de obter do que o passaporte físico, que às vezes entra em falta na casa da moeda ou nas superintendências do MAPA. O passaporte é ideal para aquele tutor que viaja frequentemente, principalmente para países do Mercosul, onde ele é aceito como documento único de trânsito, dispensando a emissão de um novo CVI a cada cruzamento de fronteira, desde que as vacinas e exames clínicos estejam em dia.

Essa distinção é crucial para o seu planejamento. Muitos tutores chegam à clínica pedindo o “passaporte” quando, na verdade, precisam apenas de um atestado de saúde para emitir o CVI online. O passaporte físico exige que o animal tenha nascido no Brasil ou tenha sido importado definitivamente. Além disso, o animal deve ter pelo menos 90 dias de vida. Portanto, antes de iniciar a saga da documentação, avalie a frequência das suas viagens. Se for algo esporádico, o CVI eletrônico resolverá seu problema com agilidade. Se for rotina, o livreto azul será seu melhor amigo.

A diferença técnica entre o Passaporte e o CVI

O Passaporte para Trânsito de Cães e Gatos funciona como um documento de identidade oficial e um registro sanitário permanente. Ele centraliza as informações de microchip, vacinas, tratamentos antiparasitários e exames clínicos. A grande mágica desse documento acontece nas viagens para países do Mercosul. O Brasil tem acordos com Argentina, Paraguai, Uruguai e Venezuela que permitem o trânsito apenas com esse passaporte validado, sem a necessidade de emitir um novo papel a cada ida e volta. Isso economiza tempo e taxas, facilitando a vida de quem mora em regiões de fronteira ou viaja muito a negócios.

Por outro lado, o CVI é um retrato momentâneo da saúde do animal. Ele atesta que, naquele momento específico, o cão está apto a viajar e cumpre as exigências do país de destino. O CVI tem validade curta, geralmente de 5 a 10 dias para o embarque, dependendo do país para onde você vai. Isso significa que todo o processo burocrático deve ser refeito a cada nova viagem internacional. Para destinos fora do Mercosul, mesmo que você tenha o passaporte brasileiro, muitas vezes precisará do CVI, pois nem todos os países reconhecem o nosso passaporte como documento sanitário de entrada, embora ele sirva como uma excelente carteira de vacinação validada.

Outro ponto técnico relevante é a forma de emissão. O passaporte requer uma ida presencial a uma unidade do Vigiagro em algum momento do processo para a confecção do documento físico e a conferência do animal e do microchip. Já o CVI, atualmente, pode ser feito quase que totalmente de forma digital em muitos casos, através do portal do governo, agilizando o processo para quem tem prazos apertados. Como veterinário, recomendo o passaporte para quem vê a viagem internacional como um estilo de vida recorrente, não como um evento único.

Quem tem direito e validade do documento

Não são todos os animais que podem ter o passaporte brasileiro. A legislação é clara ao restringir o documento a cães e gatos. Se você tem um furão ou um coelho, as regras são outras e envolvem guias de trânsito específicas. Além da espécie, a origem do animal é determinante. Apenas animais nascidos no Brasil ou aqueles nascidos no exterior, mas que já foram importados definitivamente e nacionalizados, podem requerer o documento. Isso evita que animais em trânsito temporário criem um vínculo documental permanente sem a devida rastreabilidade de origem.

Sobre a validade, aqui reside uma das maiores confusões que vejo no consultório. O documento físico (o caderninho azul) não tem data de expiração, assim como o seu RG. No entanto, as informações contidas nele vencem. A vacina de raiva tem validade de um ano (na maioria dos protocolos brasileiros). O atestado de saúde clínica que o veterinário assina na página específica do passaporte tem validade de apenas alguns dias. Portanto, ter o passaporte na gaveta não significa que seu cão está pronto para embarcar amanhã. Você precisa mantê-lo “vivo” com as atualizações sanitárias periódicas.

O tutor também precisa ser o proprietário legal do animal registrado no documento. Se o cão mudar de dono, o passaporte não pode ser simplesmente entregue ao novo tutor como se fosse uma coleira. É necessário um processo de transferência de propriedade ou a emissão de um novo documento, dependendo das normativas vigentes na época. A responsabilidade legal sobre a saúde daquele animal e sobre quaisquer danos que ele possa causar em outro país está atrelada ao nome que consta no passaporte. Mantenha seus dados sempre atualizados junto ao sistema do governo.

A importância do reconhecimento internacional pelo MAPA

O Ministério da Agricultura (MAPA) é a autoridade máxima sanitária no Brasil quando o assunto é trânsito animal. Quando um auditor fiscal federal agropecuário assina ou valida um passaporte, ele está dando uma garantia em nome do Estado brasileiro para o governo estrangeiro. Isso é muito sério. Significa que o Brasil atesta que aquele animal não representa risco biológico. Por isso, o rigor na conferência de datas, lotes de vacinas e assinaturas de veterinários particulares é tão alto. Um erro simples, como uma data rasurada, pode invalidar o documento numa fronteira.

Esse reconhecimento internacional é fruto de acordos diplomáticos e sanitários. O Brasil segue diretrizes da OIE (Organização Mundial de Saúde Animal). Quando preenchemos o passaporte ou o atestado para o CVI, não estamos apenas cumprindo burocracia, estamos seguindo padrões globais de vigilância epidemiológica. Países livres de raiva, como o Reino Unido ou o Japão, confiam na documentação do MAPA para permitir a entrada de animais vindos de áreas endêmicas. O passaporte é o elo de confiança entre os serviços veterinários de diferentes nações.

Você deve encarar o carimbo do MAPA como um selo de qualidade sanitária. Sem ele, nenhum atestado emitido pelo seu veterinário de confiança tem valor legal fora do Brasil. O veterinário particular (eu, no caso) atesta a saúde clínica; o MAPA atesta a validade legal e internacional dessa informação. É um trabalho em conjunto. Por isso, sempre oriento: não deixe para procurar o Vigiagro na véspera da viagem. O reconhecimento oficial exige prazos que não podem ser atropelados sob pena de o animal ser impedido de embarcar ou, pior, ficar retido em quarentena no destino.

Requisitos Sanitários Obrigatórios e Vacinação

A base de qualquer viagem internacional com pets é a saúde preventiva. Não existe “jeitinho” quando falamos de barreiras sanitárias. O rigor existe para proteger os rebanhos e a população humana de zoonoses graves, sendo a raiva a principal delas. Como veterinário, minha função é garantir que o sistema imunológico do seu cão esteja competente para responder aos desafios do ambiente e que ele esteja devidamente identificado. Sem identificação e sem imunização comprovada, não há viagem.

O cronograma de preparação sanitária deve começar meses antes da data prevista para o embarque. Muitos tutores compram a passagem aérea e só depois vêm me procurar, o que gera um estresse desnecessário. Alguns países exigem exames que demoram 90 dias para serem validados. Portanto, a regra de ouro é: decidiu viajar? Traga o cão para um check-up e alinhamento de cronograma imediatamente. A vacina dada na campanha de rua, muitas vezes, não serve para viagem por falta de rastreabilidade ou certificação adequada no documento.

Vamos detalhar os três pilares sanitários que você precisa dominar: a identificação eletrônica, a vacinação e, em alguns casos, a comprovação laboratorial de que a vacina funcionou. Cada um desses passos deve seguir uma ordem cronológica específica. Se você vacinar antes de microchipar, por exemplo, essa vacina pode não ser aceita por alguns países, obrigando você a revacinar o animal e esperar novos prazos. A ordem dos fatores altera, e muito, o resultado final aqui.

Implantação do Microchip (Padrão ISO 11784/11785)

O microchip é o RG mundial do seu cachorro. Trata-se de um dispositivo minúsculo, do tamanho de um grão de arroz, implantado sob a pele, geralmente na região da nuca. É fundamental que você entenda que o microchip não é um GPS. Ele não serve para rastrear seu cão via satélite se ele fugir. Ele funciona por radiofrequência passiva. Isso significa que ele só transmite o número de identificação quando um leitor específico é passado sobre o corpo do animal.

Para fins de passaporte e viagens internacionais, o microchip deve seguir o padrão ISO 11784 e a tecnologia ISO 11785. Por que isso é importante? Porque os leitores usados nos aeroportos da Europa, Estados Unidos e Japão leem esse padrão universal. Se você colocar um microchip fora do padrão, o leitor não vai identificar o número, e seu animal será considerado “não identificado”, sendo barrado na entrada. A aplicação é rápida, praticamente indolor (semelhante a uma vacina) e não requer sedação na maioria dos casos.

A regra cronológica é sagrada: o microchip deve ser implantado antes ou no mesmo dia da vacina antirrábica. Nunca depois. O raciocínio lógico das autoridades sanitárias é que, para certificar que a vacina foi dada naquele animal específico, ele já precisava estar identificado eletronicamente no momento da injeção. Certifique-se de que o veterinário colou a etiqueta com o código de barras no documento do animal e datou corretamente a implantação.

Protocolo de vacinação antirrábica e imunologia

A raiva é uma doença fatal e uma questão de saúde pública global. Por isso, a vacinação antirrábica é o item mais vigiado no passaporte. Para viagens internacionais, não basta dizer que vacinou; precisamos provar com detalhes técnicos. A vacina deve ser feita com produtos inativados (vírus morto), produzidos por laboratórios reconhecidos. Vacinas de campanhas públicas muitas vezes são aceitas, mas o preenchimento do comprovante deve ser impecável, contendo laboratório, partida, validade e assinatura do responsável.

Existe um conceito chamado “período de imunização”. Após a aplicação da vacina, o organismo do cão leva um tempo para produzir anticorpos suficientes. Para o passaporte e o CVI, esse período é de, no mínimo, 21 dias para primovacinação (a primeira vacina da vida ou se a anterior venceu). Você não pode vacinar hoje e viajar amanhã. O sistema entende que o animal ainda está desprotegido nesses primeiros dias. Mantenha a vacinação anual rigorosamente em dia para evitar ter que cumprir novas quarentenas de 21 dias.

Como veterinário, sempre verifico o estado geral do paciente antes de vacinar. Um animal debilitado, com febre ou parasitose pode não responder bem à vacina, falhando na produção de anticorpos. Por isso, a consulta pré-vacinal é tão importante. Não veja a vacina apenas como uma exigência burocrática, mas como a proteção real da vida do seu companheiro. Em muitos destinos, a fauna local pode ser reservatório de raiva (como morcegos ou raposas), e um cão protegido é um cão seguro.

Sorologia de raiva e prazos de quarentena

Para destinos como os países da União Europeia, Japão e alguns outros, a vacina sozinha não convence as autoridades. Eles exigem uma prova de que o sistema imune do cão realmente reagiu. É aí que entra a sorologia de anticorpos neutralizantes contra a raiva. Este exame quantifica a proteção no sangue do animal. O resultado deve ser superior a 0,5 UI/ml. Se der menos que isso, o animal é considerado não protegido, mesmo vacinado, e precisa ser revacinado e retestado.

A coleta do sangue para a sorologia deve ser feita, no mínimo, 30 dias após a vacinação. E aqui vem o detalhe que pega muita gente de surpresa: após a coleta do sangue (com resultado satisfatório), existe uma quarentena de 90 dias antes de o animal poder entrar na União Europeia. Ou seja, o processo todo leva pelo menos 4 meses (30 dias pós-vacina + espera do laudo + 90 dias de quarentena). Planejamento é tudo. Esse exame deve ser feito em laboratórios credenciados pelo país de destino, e o Brasil possui poucas opções credenciadas, o que pode encarecer e demorar o processo.

Uma vez feita a sorologia com sucesso, ela pode valer por toda a vida do animal, desde que os reforços anuais da vacina de raiva sejam feitos antes da data de vencimento da dose anterior. Se você atrasar um dia a vacina anual, a sorologia perde a validade e todo o processo (e o custo) deve ser refeito. Por isso, oriento meus pacientes a vacinarem com 11 meses de intervalo, para garantir uma margem de segurança e manter o status sanitário do passaporte “blindado”.

O Processo de Emissão Passo a Passo no Vigiagro

Agora que você entendeu a parte biológica, vamos para a parte administrativa. O Vigiagro (Sistema de Vigilância Agropecuária Internacional) é o braço do MAPA nos aeroportos e fronteiras. São eles que emitem o passaporte e o CVI. Antigamente, era necessário ir fisicamente com pilhas de papel. Hoje, a digitalização avançou muito, mas o passaporte azul ainda tem etapas presenciais obrigatórias para a conferência da identidade do animal.

O processo exige paciência e organização. Recomendo que você tenha uma pasta física exclusiva para os documentos do pet. Guarde originais e cópias de tudo. Carteira de vacinação antiga, a atual, laudos de microchipagem, atestados de saúde. A perda de um documento antigo pode quebrar a “corrente” de comprovação de histórico vacinal, o que é desastroso para validações de sorologia. Organização é a chave para não ser barrado no guichê do ministério.

Você precisará atuar em duas frentes: com o seu veterinário particular (na clínica) e com o auditor fiscal (no órgão público). O veterinário gera os dados clínicos, e o auditor valida esses dados legalmente. Um não faz o trabalho do outro. O auditor não examina o cão clinicamente (ausculta, temperatura), ele confere se a documentação diz que o cão está saudável e se o microchip confere com o papel apresentado.

Documentação exigida e preenchimento de formulários

Para solicitar o passaporte, você precisará preencher o requerimento oficial no sistema ou em papel, dependendo da unidade do Vigiagro. Os documentos básicos são: documento de identidade do tutor, comprovante de residência, documento de comprovação do microchip (com a data de aplicação) e a carteira de vacinação atualizada. Lembre-se: o nome no comprovante de residência deve bater com o nome do proprietário. Se você mora de aluguel e a conta está em nome de outro, precisará de uma declaração.

O preenchimento dos formulários deve ser minucioso. Erros de digitação no nome do animal, na data de nascimento ou no número do microchip são fatais. Já vi passaportes serem negados porque o número do microchip tinha um dígito trocado no formulário em relação à etiqueta colada na carteirinha. Verifique, cheque e recheque. A descrição da pelagem também deve ser fiel. Se o cão é “preto e branco”, não coloque apenas “preto”.

Além disso, é necessário apresentar uma declaração de que o proprietário reside no Brasil. O passaporte brasileiro é um benefício para residentes. Estrangeiros ou brasileiros que moram fora e estão de passagem geralmente utilizam o CVI e os documentos de seus países de origem. Tenha em mente que a foto para o passaporte tem especificações: tamanho 5x7cm ou 3x4cm (dependendo do modelo atual), fundo branco, animal de frente, pegando do ombro para cima. Capriche na foto, afinal, é o documento oficial do seu amigo.

O papel do Médico Veterinário particular

O seu veterinário de confiança é a peça chave. É ele quem vai assinar o atestado de saúde (modelo AS-1 ou similar exigido pelo MAPA) afirmando que o animal não apresenta sinais de doenças infectocontagiosas e está apto para viajar. Esse exame clínico deve ser rigoroso. Eu verifico mucosas, hidratação, ausculta cardíaca e pulmonar, palpação abdominal e temperatura. Também procuro por ectoparasitas (pulgas e carrapatos), pois a presença deles inviabiliza o atestado.

A responsabilidade técnica é imensa. Se eu atesto que um animal está saudável e ele chega no destino doente, eu posso responder ético e criminalmente. Por isso, não peça para seu veterinário “dar um jeitinho” nas datas ou atestar sem ver o animal. O atestado tem validade curtíssima (geralmente 3 a 10 dias até a apresentação no Vigiagro), então a consulta deve ser agendada estrategicamente perto da data de emissão do documento de viagem.

Além do atestado, o veterinário precisa preencher e assinar a carteira de vacinação de forma legível, com carimbo contendo o número do CRMV. Rasuras não são toleradas. Se a carteirinha do seu cão está velha, suja ou ilegível, peça ao veterinário para passar os dados para uma nova (transcrição), atestando a veracidade das informações anteriores. A clareza das informações facilita a vida do auditor fiscal e agiliza sua liberação.

Agendamento e emissão física do documento

Com todos os papéis em mãos (originais e cópias), microchip aplicado e vacinas em dia, você deve agendar o atendimento na unidade do Vigiagro mais próxima. Esse agendamento geralmente é feito online. Verifique a disponibilidade com antecedência, pois em épocas de férias e fim de ano, a agenda lota rapidamente. Não deixe para a última semana.

No dia agendado, você deve levar o cão. Essa é a grande diferença para a emissão do CVI online (que não exige a presença física do pet no órgão público). Para o primeiro passaporte, o auditor fiscal precisa ler o microchip do animal pessoalmente para confirmar que aquele cão é, de fato, o cão dos documentos. O animal deve estar contido (guia e coleira) e tranquilo. Se o cão for reativo, avise antes e prepare-se para ajudar na contenção.

Após a conferência, a emissão do passaporte pode levar alguns dias úteis ou ser feita na hora, dependendo da demanda da unidade. O documento é entregue ao tutor, que deve assiná-lo. A partir desse momento, você tem em mãos um documento vitalício. Cuide dele como cuida do seu. Lembre-se que, a cada viagem, você precisará voltar ao veterinário para o exame clínico e, se for para o Mercosul, validar a viagem na página de “Legalização” do próprio passaporte, sem custo de emissão de CVI, o que é uma grande vantagem.

Planejamento da Viagem e Bem-estar Animal

Ter o passaporte na mão é apenas a parte burocrática. Agora precisamos falar sobre o animal. Viajar de avião, principalmente no porão, é uma experiência estressante para o cão. O ambiente é barulhento, com pressão atmosférica diferente e odores estranhos. Como veterinário, minha prioridade é o bem-estar mental e físico do paciente. Um cão despreparado pode sofrer traumas, ter crises de ansiedade ou até problemas físicos graves como hipertermia (excesso de calor).

Você precisa começar o treinamento do animal meses antes. Não espere que seu cão entre numa caixa apertada e fique lá por 10 horas tranquilamente se ele nunca viu aquela caixa na vida. O planejamento envolve condicionamento positivo. O sucesso da viagem depende 50% dos documentos e 50% da preparação emocional do pet.

Além disso, considere a saúde física. Cães idosos, cardiopatas, obesos ou com problemas renais precisam de uma avaliação minuciosa. Às vezes, a recomendação veterinária mais honesta e dolorosa que posso dar é: “não leve seu cão”. Se o risco de saúde for maior que o benefício da viagem, deixar o pet com um cuidador de confiança pode ser o maior ato de amor que você pode ter.

Adaptação à caixa de transporte (Caixa IATA)

A caixa de transporte, ou kennel, deve ser o porto seguro do seu cão, não uma prisão. As companhias aéreas exigem o padrão IATA: material rígido, ventilação adequada, travas de segurança e espaço suficiente para o cão ficar em pé, dar uma volta em torno de si mesmo e deitar-se naturalmente. Se a orelha do cão encostar no teto quando ele está de pé, a caixa está pequena e o embarque será negado.

Comece a adaptação em casa. Deixe a caixa aberta na sala, coloque a caminha dele dentro, ofereça petiscos e refeições lá dentro. Faça com que entrar na caixa seja uma experiência recompensadora. Com o tempo, feche a porta por alguns segundos, depois minutos, sempre premiando o comportamento calmo. O objetivo é que, no dia da viagem, a caixa seja um pedaço familiar de casa num ambiente estranho.

Nunca compre a caixa na véspera. O cheiro de plástico novo pode ser enjoativo. A caixa deve ter o cheiro do animal. Coloque uma peça de roupa sua usada dentro da caixa no dia da viagem para que ele sinta seu cheiro e se acalme. Evite rodinhas na caixa durante o voo (elas devem ser removidas ou travadas) e verifique se o bebedouro está bem fixado para não molhar o animal durante turbulências.

Manejo alimentar e hídrico pré-voo

O jejum é um ponto controverso, mas essencial. Cães podem enjoar com o movimento e a ansiedade. Se o estômago estiver cheio, o risco de vômito é alto. O vômito dentro da caixa fechada pode levar à broncoaspiração (o cão respira o vômito para o pulmão), o que é fatal. Recomendo um jejum de sólidos de 6 a 8 horas antes do embarque. Isso garante que o estômago esteja vazio, mas o animal ainda tenha energia.

A água, por outro lado, não deve ser restringida drasticamente para evitar desidratação, especialmente em voos longos e com ar condicionado seco do avião. Ofereça água até pouco tempo antes do embarque, mas com moderação para evitar que ele urine excessivamente na caixa logo no início. Uma dica de ouro é congelar a água no bebedouro da caixa. Assim, ela vai derretendo aos poucos durante a viagem, o cão vai lambendo o gelo, se hidrata e se distrai, sem derramar tudo na primeira movimentação da carga.

No dia da viagem, evite oferecer comidas diferentes ou petiscos que ele não está acostumado. Mantenha a dieta básica para evitar diarreias por estresse gastrointestinal. Se o cão tem estômago sensível, converse com seu veterinário sobre o uso de protetores gástricos ou antieméticos (remédios para enjoo) seguros para serem administrados antes de sair de casa.

Sedativos vs. Ansiolíticos e segurança

Aqui preciso ser muito firme: sedar o animal para viajar no porão é extremamente perigoso e contraindicado pela maioria das companhias aéreas e veterinários. Sedativos diminuem a pressão arterial, a frequência cardíaca e respiratória. Na altitude, somado à pressurização da cabine, isso pode levar a uma parada cardiorrespiratória. Além disso, o animal sedado perde o equilíbrio e não consegue reagir a turbulências, podendo se machucar batendo nas paredes da caixa.

No entanto, isso não significa que não podemos ajudar o animal quimicamente. Existem fitoterápicos, feromônios sintéticos e, em casos específicos, ansiolíticos modernos que diminuem o medo e a ansiedade sem causar sedação profunda ou relaxamento muscular perigoso. Gabapentina e Trazodona são exemplos de fármacos que usamos com frequência, mas apenas sob estrita prescrição e teste prévio.

Nunca dê um remédio pela primeira vez no dia do voo. Você precisa testar a reação do cão dias antes, em casa. Alguns animais podem ter o “efeito paradoxal” e ficarem mais agitados em vez de calmos. A segurança farmacológica deve ser personalizada para o peso, idade e histórico de saúde do seu pet. Confie no protocolo do seu veterinário, não na dica da internet.

Legislações Específicas e Casos Especiais

Cada país é soberano em suas regras sanitárias. O que vale para a França não vale necessariamente para o Reino Unido, mesmo ambos estando na Europa. O que vale para os EUA mudou drasticamente nos últimos anos devido ao risco de raiva. Você, como tutor, precisa virar um especialista no seu destino. Consultar o site do consulado ou a embaixada do país de destino é tarefa de casa obrigatória.

Além das leis de países, existem as regras das companhias aéreas. Elas podem ser mais rígidas que as leis dos países. Por exemplo, um país pode aceitar determinada raça, mas a companhia aérea pode se recusar a transportá-la. Verifique sempre as duas pontas: a exigência sanitária governamental e a exigência operacional da empresa transportadora.

Abaixo, um quadro comparativo para ajudar a visualizar as diferenças entre os documentos que citamos:

CaracterísticaPassaporte Brasileiro (MAPA)CVI (Certificado Vet. Internacional)Carteira de Vacinação Comum
EmissorMinistério da Agricultura (Vigiagro)Ministério da Agricultura (Vigiagro)Médico Veterinário Particular
Validade DocumentalVitalícia (o documento físico)Apenas para a viagem específica (5-10 dias)Indeterminada (histórico)
Aceitação MercosulDispensa CVI se validadoObrigatório (se não tiver passaporte)Não serve para trânsito internacional
Aceitação Europa/EUAServe como histórico, mas exige CVI muitas vezesObrigatório (padrão aceito)Serve apenas como suporte de dados
Custo de EmissãoGratuito (taxas podem aplicar em exames)Gratuito (digital)Custo da consulta/vacina

Viagens para países do Mercosul vs. União Europeia

Viajar para o Mercosul é, sem dúvida, o cenário mais amigável para o passaporte brasileiro. O acordo permite que o documento substitua o CVI. Você vai ao Vigiagro, o auditor verifica as vacinas e o atestado do veterinário e carimba a “Legalização” dentro do próprio passaporte. Pronto, seu cão pode entrar na Argentina ou Uruguai. É prático e valoriza o documento.

Já para a União Europeia, o buraco é mais embaixo. Além da microchipagem e vacina, temos a sorologia obrigatória (que discutimos antes) e um formulário específico da UE (Health Certificate) que deve ser anexado ao CVI brasileiro. O passaporte brasileiro serve aqui apenas como a fonte oficial das informações de vacina e microchip, mas ele sozinho não abre as portas da Europa. Você precisará emitir o CVI baseado nos dados do passaporte.

Outro detalhe da Europa é o tratamento contra echinococcus (verme) que deve ser administrado por um veterinário entre 24h e 120h antes da entrada em alguns países (como Irlanda, Malta, Finlândia). Essa informação deve constar no passaporte ou CVI com hora exata da administração. Atenção aos fusos horários para não perder essa janela de tempo.

Raças braquicefálicas e restrições aéreas

Se você tem um Pug, Bulldog (Francês ou Inglês), Boxer, Shih Tzu ou qualquer cão de focinho curto, a luz vermelha deve acender. Esses cães, chamados braquicefálicos, têm dificuldade anatômica para respirar e regular a temperatura corporal. Em situações de estresse e calor no porão do avião, o risco de morte é estatisticamente muito maior.

Devido a isso, muitas companhias aéreas proibiram terminantemente o transporte dessas raças no porão. Algumas aceitam na cabine, se o peso e tamanho permitirem (geralmente até 7-10kg somando cão + caixa). Se o seu cão é braquicefálico e grande demais para a cabine, suas opções de viagem aérea são limitadíssimas, muitas vezes restritas a empresas de transporte de carga viva especializada, o que custa muito caro.

Antes de tirar o passaporte, verifique se o seu cão pode voar. Não adianta ter a documentação perfeita se nenhuma companhia aceita embarcar o animal. Consulte seu veterinário sobre a viabilidade física de uma viagem longa para essas raças. Às vezes, a viagem por terra ou a permanência no Brasil é a única opção ética e segura.

Retorno ao Brasil e revalidação

Você foi, curtiu a viagem e agora precisa voltar. Como faz? Se você viajou com o passaporte brasileiro para o Mercosul e ele ainda está dentro do prazo de validade do atestado sanitário (geralmente 60 dias para retorno ao Brasil em alguns acordos, mas verifique a regra atualizada), você retorna com o mesmo documento.

Porém, se você foi para a Europa ou EUA com CVI, para voltar ao Brasil você precisará emitir um novo documento sanitário no país onde você está. Você terá que procurar a autoridade veterinária local (o “USDA” nos EUA, ou o órgão equivalente na Europa) para emitir um certificado que autorize a entrada no Brasil. O Brasil exige que o cão esteja saudável, com vacina de raiva em dia e livre de parasitas.

Não ache que “porque o cão é brasileiro” ele entra automaticamente. A barreira sanitária funciona para os dois lados. Se você deixar vencer a vacina de raiva enquanto estiver fora, terá problemas sérios para reembarcar o animal. Mantenha o calendário sanitário em dia onde quer que você esteja.

Viajar com seu cão é uma aventura inesquecível que exige responsabilidade profissional. O passaporte é a materialização desse cuidado. Faça tudo com antecedência, consulte seu veterinário e boa viagem!

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