Como Ensinar o Cachorro a Vir Quando Chamado: O Guia Definitivo do Veterinário
Imagine a cena: você está no parque, o sol está brilhando e você decide soltar a guia para deixar seu cão correr um pouco. De repente, algo chama a atenção dele — talvez um esquilo, outro cão ou uma bicicleta passando rápido. Você sente aquele frio na barriga e grita o nome dele. O que acontece em seguida define a diferença entre um passeio relaxante e um momento de pânico absoluto. Se ele virar imediatamente e correr para os seus braços, você tem o “Santo Graal” do adestramento. Se ele ignorar e continuar correndo, temos um problema de segurança sério.
Ensinar o comando “vem” (ou recall, como chamamos tecnicamente) não é apenas um truque bonitinho para mostrar aos amigos.[1] Na minha rotina clínica, vejo inúmeros casos de acidentes, atropelamentos ou brigas que poderiam ter sido evitados se o cão tivesse um chamado confiável. Como veterinário, costumo dizer que este é o “comando salva-vidas”. É a ferramenta mais importante que você pode dar ao seu animal para garantir que ele tenha liberdade com segurança. Sem um chamado confiável, a liberdade do seu cão será sempre restrita ao comprimento da guia.
Mas não se preocupe. Ensinar isso não exige que você seja um adestrador profissional ou que tenha horas livres todos os dias. O segredo está na consistência, na motivação correta e em entender como o cérebro do seu cão funciona. Vamos deixar de lado a teoria complicada e focar no que realmente funciona na prática, transformando você na pessoa mais interessante do mundo aos olhos do seu pet.
Preparando o Terreno para o Sucesso[2]
Antes de começarmos a gritar “Vem!” pela casa, precisamos preparar o cenário. Muitos tutores falham não porque o cão é teimoso, mas porque pularam a etapa de preparação. O aprendizado canino depende muito do ambiente e da motivação. Se você tentar ensinar cálculo num show de rock, ninguém vai aprender nada. Com cães é a mesma coisa. Precisamos configurar o ambiente para que o erro seja quase impossível no início.
A mentalidade aqui deve ser de “construção de valor”. O seu chamado deve ser como o som da notificação de que o salário caiu na conta: uma promessa garantida de algo maravilhoso. Se o seu cão acha que vir até você é o fim da diversão (como ser colocado na coleira para ir embora do parque), ele vai começar a pesar as opções. E, acredite, cheirar aquele arbusto novo vai ganhar de você. Vamos construir uma fundação onde vir até você seja sempre a melhor opção disponível.
Além disso, precisamos alinhar as ferramentas. Não adianta usar uma guia curta que tensiona o pescoço o tempo todo ou petiscos sem graça que ele come todo dia na ração. O treino de recall exige munição pesada. Estamos competindo com o mundo lá fora, que é cheio de cheiros, sons e movimentos estimulantes. Para vencer essa competição, você precisa ser mais interessante que o mundo. E isso começa com o que você tem no bolso e onde você decide treinar.
Escolhendo a Recompensa Irresistível
Esqueça o biscoito seco que fica no pote da cozinha há semanas. Para ensinar um comando vital como este, precisamos de recompensas de alto valor. Na clínica, uso o termo “pagamento premium”. Se você fosse trabalhar e seu chefe te pagasse com abraços, você provavelmente procuraria outro emprego. Seu cão funciona da mesma forma. Para comportamentos difíceis, o pagamento deve ser excelente.[2] Pense em pedacinhos de frango cozido, queijo, salsicha ou aquele petisco úmido que ele só vê em ocasiões especiais.
A hierarquia da recompensa é fundamental. Eu atendo pacientes que fariam qualquer coisa por uma bolinha de tênis e ignorariam um filé mignon. Você precisa descobrir o que é o “ouro” para o seu cão. Faça testes em casa: coloque diferentes opções no chão e veja qual ele escolhe primeiro. Essa será sua ferramenta principal para o treino de chamado. Lembre-se de usar pedaços muito pequenos, do tamanho de uma unha. O objetivo não é alimentar o cão, mas dar um gosto rápido para que ele queira mais e continue focado em você.
Não subestime também o poder da recompensa emocional. Cães são leitores de energia. Quando ele chegar até você, a festa deve ser genuína. Use uma voz aguda, sorria, faça carinho vigoroso (se ele gostar). Se você diz “muito bem” com a animação de quem está lendo a lista telefônica, o cão percebe. Ele precisa sentir que chegar até você é o ponto alto do dia dele, uma verdadeira celebração. A comida atrai, mas a sua conexão emocional é o que sela o comportamento a longo prazo.
O Ambiente Ideal para Começar[3]
O maior erro que vejo é começar o treino no parque de cães no domingo de manhã. Isso é a receita para o fracasso. O cão tem um limite de atenção e, em um ambiente caótico, esse limite é de segundos. O local ideal para começar é dentro da sua casa, em um cômodo silencioso e sem distrações. Pode ser na sala, com a TV desligada e sem outros animais por perto. O tédio é seu amigo nessa fase inicial. Se nada mais interessante estiver acontecendo, você se torna a atração principal automaticamente.
À medida que o cão acerta 100% das vezes na sala, você pode mudar para o corredor, depois para o quintal (se for cercado e seguro) e só depois para a rua em horários calmos. Essa progressão gradual é o que chamamos de “generalização”. O cão precisa entender que “Vem” significa a mesma coisa na sala, no jardim e na praia. Muitos cães são “obedientes de cozinha”: fazem tudo perfeito em casa, mas parecem ficar surdos assim que o portão se abre. Isso acontece porque pulamos etapas de dificuldade ambiental.
No consultório, sempre recomendo a regra dos 90%. Só avance para um ambiente mais difícil se o seu cão estiver obedecendo 90% das vezes no ambiente atual. Se ele falhar, volte um passo. Não tenha pressa. É melhor gastar duas semanas treinando na sala e ter uma base sólida do que correr para o parque e ensinar ao cão que ele pode ignorar você quando houver distrações. A paciência é a ferramenta mais rápida no adestramento canino.
A Importância da Linguagem Corporal[2]
Cães são mestres em leitura corporal, muito mais do que em compreensão verbal. Muitas vezes, o que dizemos com a boca contradiz o que dizemos com o corpo. Um erro clássico é chamar o cão enquanto você caminha em direção a ele com o corpo inclinado para frente. Na linguagem canina, mover-se diretamente em direção a alguém pode ser interpretado como um sinal de confronto ou de que você quer espaço, o que faz o cão recuar ou parar.
Para convidar o cão a vir, sua linguagem corporal deve ser acolhedora e de “recuo”. Abaixar-se ao nível dele, abrir os braços e até dar alguns passos para trás são sinais universais de convite. Quando você recua, o instinto natural do cão é perseguir ou diminuir a distância. Use isso a seu favor. Se o cão estiver hesitante, vire de lado ou até dê as costas e corra um pouco para longe dele, olhando por cima do ombro. Isso desperta o instinto de perseguição de forma positiva, fazendo com que ele corra atrás de você brincando.
Evite a postura de “predador”: corpo tenso, encarando fixamente o cão e mãos estendidas como garras prontas para agarrar a coleira. Isso assusta muitos cães, especialmente os mais sensíveis ou resgatados que podem ter traumas passados. Mantenha-se relaxado. Se você estiver frustrado, seu corpo vai “gritar” isso, e o cão não vai querer se aproximar de uma fonte de tensão. Respire fundo, solte os ombros e torne-se um porto seguro para onde ele queira voltar.
O Passo a Passo do Treino Infalível
Agora que preparamos o terreno, vamos para a prática. O método que utilizo e recomendo é baseado no reforço positivo e na construção de camadas de dificuldade. Não existe mágica, existe repetição inteligente. O objetivo é criar um reflexo condicionado: ouviu o comando, as pernas se movem em direção ao tutor antes mesmo de o cão pensar sobre isso.
Vamos dividir isso em três fases claras. É crucial que você não pule fases. Pense nisso como a alfabetização: não dá para escrever um livro se você ainda não aprendeu as letras. Siga o ritmo do seu cão. Alguns aprendem em dias, outros levam semanas. E está tudo bem. O importante é que o aprendizado seja sólido e feliz.
Lembre-se de definir uma palavra de comando e ser fiel a ela. Pode ser “Vem”, “Aqui”, “Junto” ou até um assobio específico. O que importa é não variar. Se hoje você usa “Vem”, amanhã “Chega” e depois “Vem cá menino”, você só vai criar confusão na cabeça do animal. Escolha uma e avise toda a família para usar a mesma.
Fase 1: O “Vem” em Curta Distância e Sem Distrações
Comece em um local fechado e tranquilo. Tenha os petiscos deliciosos prontos no bolso ou numa pochete, mas escondidos. Espere o cão se distrair um pouco ou se afastar uns dois metros de você. Diga o nome dele para chamar a atenção e, assim que ele olhar, diga o comando escolhido (“Vem!”) com um tom de voz alegre e convidativo. Imediatamente, mostre o petisco ou o brinquedo.
Assim que ele chegar até você — e tocar na sua mão ou estiver perto o suficiente para você tocar na coleira dele sem esticar o braço — marque o comportamento com um “Muito bem!” ou o som do clicker e entregue a recompensa. É importante recompensar apenas quando ele estiver bem próximo. Se você jogar o petisco longe, você está recompensando ele por se afastar, e não por se aproximar. Repita isso várias vezes, 5 a 10 minutos por sessão, algumas vezes ao dia.
Nesta fase, introduza o hábito de segurar a coleira suavemente enquanto ele come o petisco. Muitos cães aprendem a vir, pegar a comida e fugir (o famoso “pega e corre”). Queremos que ele se sinta confortável com sua mão na coleira. Então: chame, ele vem, você segura a coleira delicadamente, dá o petisco, solta a coleira e diz “ok, pode ir”. Isso ensina que vir até você não significa o fim da liberdade, apenas uma pausa saborosa.
Fase 2: Introduzindo a Guia Longa e Aumentando a Distância
Quando o cão estiver respondendo instantaneamente dentro de casa, vamos para fora (quintal ou uma área tranquila) usando uma guia longa. Uma guia longa é uma ferramenta de treino que tem entre 5 a 10 metros. Ela serve como um cinto de segurança: dá a sensação de liberdade para o cão, mas garante que você ainda tenha o controle caso ele decida ignorar você. Nunca, jamais, pratique o “vem” em área aberta sem proteção se o comando não estiver 100% consolidado.
Deixe o cão explorar o ambiente com a guia longa arrastando no chão (se for seguro) ou segurando a ponta frouxa. Espere ele se interessar por um cheiro na grama. Diga o nome e o comando “Vem!”. Se ele virar e vier, festa enorme e recompensa premium. Se ele ignorar, não repita o comando mil vezes. Pegue a guia e dê toques suaves, apenas para lembrar que você está ali, ou comece a recolher a guia gentilmente enquanto recua, incentivando-o a vir até você.
O objetivo da guia longa não é arrastar o cachorro como um peixe no anzol. Ela serve para impedir que ele se recompense com o ambiente (continuar cheirando ou correndo) após ignorar seu chamado. Assim que ele começar a se mover na sua direção após o toque na guia, elogie muito. Ele precisa entender que a pressão na guia desaparece e a festa começa quando ele decide caminhar na sua direção. Aumente a distância gradualmente, aproveitando todo o comprimento da guia.
Fase 3: Adicionando Distrações Gradualmente (A Prova de Fogo)
Aqui é onde a maioria dos tutores desiste, mas é onde o verdadeiro aprendizado acontece. Precisamos ensinar ao cão que você é mais interessante que o outro cachorro, a bola ou a pessoa passando. Comece com distrações baixas. Peça para um amigo ficar parado a uma certa distância, ou deixe um brinquedo sem graça no chão. Chame o cão. Se ele vier direto a você ignorando a distração, ele acabou de ganhar o “jackpot” (dê vários pedaços de petisco seguidos, um após o outro).
Se ele tentar ir até a distração, use a guia longa para impedir que ele chegue lá. Ele vai aprender que tentar acessar a distração sem permissão não funciona, mas vir até você funciona maravilhosamente bem. Aumente a dificuldade aos poucos: o amigo pode começar a bater palmas, depois jogar uma bola, depois trazer outro cão (sempre a uma distância segura).
A regra de ouro aqui é a distância. Se o seu cão não consegue obedecer com um outro cão a 5 metros, aumente a distância para 10 ou 20 metros. Encontre o ponto onde ele consegue te ouvir e obedecer, e treine ali. Com o tempo, vá diminuindo essa distância. É um trabalho de paciência. Como veterinário, vejo que cães que passam por essa fase com calma se tornam adultos extremamente confiáveis e equilibrados em passeios.
Erros Comuns que Sabotam o Treino
Adestramento é tanto sobre o que não fazer quanto sobre o que fazer. Muitas vezes, sem perceber, envenenamos o comando “vem”. Já vi tutores dedicados arruinarem meses de treino com uma única atitude impensada num momento de frustração. É normal cometer erros, mas estar ciente deles vai te ajudar a corrigir a rota antes que o comportamento indesejado se instale.
O cão faz associações muito simples: A leva a B. Se “Vem” leva a algo ruim, ele vai evitar o “Vem”. Se “Vem” leva a algo bom, ele vai procurar o “Vem”. O problema é que, para nós humanos, certas coisas parecem neutras ou necessárias, mas para o cão são punições claras. Entender essa perspectiva canina é vital para manter a confiança intacta.
Vamos analisar os três maiores vilões do recall que eu presencio quase diariamente nas consultas comportamentais. Evitar essas armadilhas já é metade do caminho andado para ter um cão que volta voando para você.
Chamar Para Punir ou Fazer Algo Desagradável
Este é o pecado capital do adestramento. Imagine que seu cão fez xixi no tapete da sala. Você vê, fica bravo e grita “Rex, vem cá!”. O Rex, sendo um bom garoto, vai até você com as orelhas baixas. Quando chega, você briga com ele ou aponta para o xixi. Parabéns, você acabou de ensinar ao Rex que “Vem cá” significa “Venha aqui para eu brigar com você”. Na próxima vez, ele vai pensar duas vezes antes de obedecer.
Nunca, em hipótese alguma, use o comando de chamado para dar bronca, dar banho (se ele odeia), cortar unhas ou dar remédio ruim. Se você precisa fazer algo desagradável, vá até o cão e pegue-o calmamente, sem usar o comando de recall. O comando “Vem” deve ser sagrado, associado apenas a coisas positivas.
Se o seu cão fugiu no parque e você demorou 10 minutos gritando até ele voltar, quando ele finalmente chegar, você deve engolir sua raiva e fazer uma festa. Eu sei, é difícil. A vontade é de brigar porque ele fugiu. Mas se você brigar quando ele chega, você está punindo o ato de voltar, e não o ato de fugir. Ele vai associar sua chegada à sua raiva e, na próxima fuga, vai manter distância para se proteger.
Repetir o Comando Várias Vezes Sem Resultado
“Rex, vem! Rex, vem! Vem Rex! Vem, vem, vem!” Se eu ganhasse um real cada vez que ouço isso, estaria rico. Repetir o comando sem parar ensina o cão a ignorar a palavra. Torna-se apenas um ruído de fundo, como o barulho do trânsito. O cão aprende que não precisa obedecer na primeira vez, porque você vai chamar mais dez vezes.
Diga o comando uma única vez, com clareza. Se ele não vier, você tem que fazer acontecer. Use a guia longa para trazê-lo gentilmente, ou vá até ele, chame a atenção e incentive-o a vir. Se você não tem como garantir que ele venha (ele está solto e longe), não chame. É melhor não chamar do que chamar e ser ignorado.
Guarde o seu comando oficial para momentos em que você tem certeza de sucesso ou tem controle da situação. Se ele está brincando freneticamente com outro cão e você sabe que ele não vai ouvir, espere uma pausa na brincadeira para chamar. Não gaste suas “fichas” de comando à toa. Valorize sua palavra.
Treinar Quando o Cão Está Muito Distraído
Tentar ensinar algo novo ou exigir obediência perfeita quando o cão está com a mente em outro lugar é injusto. Imagine tentar resolver uma equação complexa enquanto assiste ao final da Copa do Mundo. O cérebro do cão, quando focado em um esquilo ou cheiro interessante, “desliga” a audição.
Se você notar que o cão está hiperestimulado, aumente a distância da distração antes de tentar o comando. Treinar muito perto do gatilho de distração antes de o cão estar pronto só gera frustração para ambos. Você fica bravo porque ele não obedece, e ele fica confuso ou estressado com sua insistência.
Respeite o estado emocional do animal. Se ele está com medo ou excessivamente excitado, acalme a situação primeiro. O aprendizado acontece melhor quando o cão está num estado de alerta calmo. Reconhecer esses limites é o que diferencia um tutor comum de um tutor “expert” que entende as necessidades do seu animal.
Técnicas Avançadas e Jogos de Reforço
Adestramento não precisa ser chato e militar. Na verdade, os cães aprendem muito mais rápido quando estão brincando. Como veterinário, sempre incentivo o uso de jogos (gamificação) para reforçar comportamentos. Isso fortalece o vínculo e torna o “vir quando chamado” uma parte divertida da vida, não uma obrigação tediosa.
Esses jogos ajudam a manter o cão alerta e focado em você. Eles transformam o “Vem” em uma caçada cooperativa, algo que os ancestrais dos cães faziam naturalmente. Ao incorporar essas brincadeiras na rotina semanal, você mantém o comando “afiado” para quando realmente precisar dele em uma situação de emergência.
Além disso, jogos ajudam a gastar energia física e mental. Um cão que brincou de “esconde-esconde” por 15 minutos estará muito mais relaxado e feliz do que um que apenas caminhou no quarteirão. Vamos ver três técnicas que uso com meus próprios cães e recomendo aos meus pacientes.
O Jogo de Esconde-Esconde
Este é o meu favorito e funciona maravilhosamente bem para cães que não prestam atenção onde o dono está. Em casa ou numa área segura, espere o cão se distrair. Esconda-se atrás de uma porta, de uma árvore ou de um sofá. Chame o nome dele e “Vem!” uma vez. Fique quieto e espere.
Quando o cão te encontrar (e ele vai usar o faro e a audição para isso), faça a maior festa do mundo, como se ele tivesse ganhado na loteria. Dê petiscos, brinque. Isso ensina o cão a monitorar onde você está. Ele começa a pensar: “Opa, tenho que ficar de olho no meu humano, senão ele some!”.
Isso inverte a dinâmica do passeio. Em vez de você ficar vigiando o cachorro o tempo todo, o cachorro começa a vigiar você para não te perder. É um exercício fantástico para a independência e para reforçar que estar perto de você é a chave para a diversão.
O Chamado de Emergência (Emergency Recall)
O chamado de emergência é diferente do “vem” do dia a dia. É uma palavra sagrada que você só usa em situações de vida ou morte (como o cão correndo para a rua) ou durante treinos específicos para mantê-la poderosa. Não deve ser a palavra comum como “Vem”. Escolha algo distinto, como “AGORA!”, “JÁ!” ou um apito específico.
Para treinar isso, você precisa de uma recompensa “nuclear”: algo que ele nunca ganha, como patê de fígado, catupiry ou carne real. Diga a palavra mágica e imediatamente entregue essa recompensa incrível, mesmo que ele esteja ao seu lado. Repita isso aleatoriamente por semanas.
A ideia é criar um reflexo pavloviano tão forte que, ao ouvir a palavra, o cão vire e corra para você esperando o “manjar dos deuses”, ignorando qualquer instinto de caça ou fuga. Nunca use essa palavra se não tiver a recompensa maravilhosa à mão, para não diluir o poder dela.
O Treino “Pingue-Pongue” com Duas Pessoas
Este é um jogo excelente para fazer em família e ajuda muito a exercitar o cão. Você e outra pessoa ficam a uma certa distância um do outro (comece com 5 metros e vá aumentando). Cada um deve ter petiscos deliciosos.
A pessoa A chama o cão. Quando ele chega, ganha prêmio e carinho. Imediatamente, a pessoa B chama o cão. Ele corre para a pessoa B, ganha prêmio e festa. Repitam isso, indo e vindo. É divertido, cansa o cachorro e reforça que atender ao chamado é sempre vantajoso, não importa quem chame.
Conforme o cão entende o jogo, vocês podem se esconder em cômodos diferentes da casa, transformando o “Pingue-Pongue” em um “Esconde-Esconde” em dupla. Isso adiciona complexidade e mantém o cão super engajado em localizar a origem do chamado.
Comparativo de Ferramentas de Chamado
Para te ajudar a escolher a melhor abordagem técnica, preparei um quadro comparativo das ferramentas mais comuns que indicamos na veterinária comportamental.
| Característica | Voz Natural | Apito de Treino | Clicker |
| Consistência | Baixa. Nossa voz muda com emoção (medo, raiva), o que pode confundir o cão. | Alta. O som é sempre idêntico, não importa se você está nervoso ou calmo. | Alta. O som é mecânico e constante, ideal para marcar o acerto exato. |
| Alcance | Médio. Depende do vento e da sua capacidade pulmonar. Difícil em dias ventosos. | Alto. O som do apito corta o vento e chega muito mais longe que a voz humana. | Curto. O clicker serve para marcar o comportamento perto de você, não para chamar de longe. |
| Custo/Facilidade | Grátis. Está sempre com você. Não precisa carregar nada extra. | Baixo. Exige que você lembre de levar o apito no pescoço. | Baixo. Exige técnica para clicar no tempo certo (timing). |
| Indicação | Ideal para o dia a dia em distâncias curtas e interação social. | Ideal para cães de caça, pastoreio ou passeios em grandes áreas abertas. | Ferramenta de apoio para ensinar o comportamento, não para executar o chamado em si. |
A escolha da ferramenta depende do seu estilo de vida. Para a maioria dos tutores urbanos, a voz bem treinada é suficiente. Mas se você costuma fazer trilhas ou ir a praias abertas, introduzir um apito pode ser um divisor de águas na segurança do seu animal.
Lembre-se: não existe cachorro impossível de treinar. Existe apenas falta de comunicação clara. Com paciência, petiscos gostosos e consistência, você vai ver a transformação acontecer. Seu cão quer te agradar e quer estar seguro ao seu lado; você só precisa mostrar a ele, na língua dele, como fazer isso. Mãos à obra e bons treinos!


