Catnip (Erva de Gato): Por que alguns gatos amam e outros ignoram?
Muitos tutores chegam ao meu consultório frustrados após comprarem o brinquedo mais caro da loja, recheado com catnip de alta qualidade, apenas para verem seus gatos cheirarem o objeto por dois segundos e saírem andando com total indiferença. Você provavelmente já passou por isso ou conhece alguém que gastou dinheiro à toa tentando agradar um felino exigente. Essa situação é perfeitamente normal e acontece com muito mais frequência do que os comerciais de produtos para pets deixam transparecer na televisão ou na internet. Entender a biologia do seu gato é o primeiro passo para não levar essa rejeição para o lado pessoal e para encontrar outras formas de enriquecer a vida dele.
A erva do gato, conhecida cientificamente como Nepeta cataria, pertence à família das hortelãs e possui um composto químico muito específico que interage diretamente com o sistema nervoso dos felinos. A reação que vemos nos vídeos da internet, onde gatos rolam no chão, babam e entram em estado de euforia, é uma resposta biológica intensa e involuntária. Não se trata de o gato “gostar” ou “não gostar” da erva como nós gostamos de chocolate ou pizza. Trata-se de o corpo dele ter ou não a chave correta para abrir a fechadura química que essa planta oferece.
Nós veterinários observamos que a resposta ao catnip é uma ferramenta valiosa para o bem-estar animal, mas ela não é universal. Compreender os mecanismos por trás dessa planta ajuda você a usar o recurso da maneira correta e a identificar se o seu gato faz parte do grupo seleto que responde a ela ou do grupo que precisa de outros estímulos. Ao longo deste texto, vou explicar como tudo isso funciona dentro do organismo do seu parceiro de quatro patas e o que você pode fazer se ele for um dos que simplesmente ignoram a famosa erva.
A ciência da Nepetalactona e o olfato felino
O segredo de todo o alvoroço causado pelo catnip reside em um óleo volátil encontrado nas folhas e caules da planta chamado nepetalactona. Quando o seu gato cheira a erva, essa substância entra nas narinas e se liga a receptores proteicos que estimulam os neurônios sensoriais. Essas células enviam sinais diretamente para o bulbo olfatório, que projeta as informações para várias regiões do cérebro, incluindo a amígdala e o hipotálamo. Essas são as áreas responsáveis pelas emoções e pelas reações instintivas, o que explica por que a resposta é tão dramática e rápida.
A nepetalactona atua mimetizando feromônios felinos associados ao acasalamento e à felicidade social. É fascinante notar que a estrutura química desse óleo é incrivelmente semelhante à de certos feromônios excretados na urina de gatos fêmeas. Isso não significa que o gato está sexualmente excitado no sentido humano da palavra, mas sim que o cérebro dele está recebendo uma enxurrada de sinais químicos que interpretam aquela substância como algo extremamente prazeroso e estimulante. O órgão vomeronasal, localizado no céu da boca do gato, também desempenha um papel crucial nessa detecção, permitindo que ele “saboreie” o cheiro de uma forma que nós humanos jamais conseguiremos compreender.
Essa interação química desencadeia uma sequência de comportamentos predatórios e lúdicos que variam de gato para gato. Alguns caçam brinquedos imaginários, outros esfregam o rosto freneticamente na fonte do cheiro para impregnar seu próprio corpo com a substância. Como veterinário, vejo isso como uma forma segura de “escapismo” para gatos que vivem exclusivamente dentro de casa. Eles conseguem expressar comportamentos naturais de caça e marcação de território sem precisarem sair do apartamento. A nepetalactona oferece uma janela de cinco a quinze minutos de pura estimulação mental, algo essencial para prevenir o tédio e a obesidade em animais sedentários.
A genética decide quem se diverte
A razão fundamental pela qual o seu gato pode ignorar completamente o catnip está gravada no DNA dele. A sensibilidade à nepetalactona é um traço hereditário autossômico dominante. Isso significa que, se um gato herda o gene da sensibilidade de pelo menos um dos pais, ele reagirá à erva. No entanto, se ele herdar genes recessivos de ambos os pais, ele será imune aos efeitos da planta. Estima-se que cerca de 30% a 40% de toda a população felina mundial não possui os receptores necessários para processar a nepetalactona dessa maneira eufórica.
Você pode ter dois gatos da mesma ninhada com reações opostas, dependendo da combinação genética exata que cada um recebeu. Isso é algo que explico frequentemente em consultas quando um tutor tem múltiplos gatos e percebe que um deles fica “louco” com o brinquedo novo enquanto o outro olha com desprezo. Não há nada de errado com o gato que não reage. Ele não está deprimido, doente ou com o olfato prejudicado. Ele simplesmente não tem a “programação” genética para sentir o barato que a erva proporciona. É uma característica física imutável, assim como a cor dos olhos ou o comprimento da pelagem.
Estudos recentes sugerem que a sensibilidade ao catnip pode variar até mesmo entre diferentes linhagens geográficas de gatos. Populações de gatos na Austrália, por exemplo, mostram taxas de resposta ligeiramente diferentes das populações na Europa ou América do Norte. Isso reforça a ideia de que a genética é o fator determinante. Portanto, se você tem um gato que não liga para a erva, não insista forçando o nariz dele no produto. Isso só vai gerar estresse e desconforto. Aceite a biologia dele e parta para outras formas de enriquecimento ambiental que discutirei mais adiante.
O fator idade e o desenvolvimento sexual
Outro aspecto que confunde muitos tutores é a idade. É muito comum as pessoas comprarem catnip para filhotes recém-chegados em casa e ficarem decepcionadas quando o gatinho não demonstra interesse. A verdade é que gatinhos com menos de três a seis meses de idade raramente respondem ao catnip. O sistema olfativo e neurológico deles ainda não está totalmente desenvolvido para processar esses sinais químicos específicos. Além disso, como a reação está ligada a comportamentos sexuais e territoriais, ela tende a emergir apenas quando o gato se aproxima da maturidade sexual.
Durante os primeiros meses de vida, o cérebro do filhote está focado em sobrevivência, aprendizado motor e vínculo materno. A natureza parece ter “desligado” a sensibilidade a esses pseudo-feromônios até que o animal tenha idade suficiente para que esses sinais façam sentido biológico. Portanto, se você ofereceu a erva para o seu filhote de três meses e ele ignorou, não jogue o pacote fora. Guarde-o em um recipiente hermético e tente novamente quando ele tiver seis ou sete meses. Você pode se surpreender ao ver uma reação completamente diferente surgir de uma hora para outra.
Na outra ponta da vida, gatos idosos também podem apresentar uma diminuição na resposta ao catnip. Com o envelhecimento, a acuidade olfativa tende a diminuir, e o cérebro pode não processar os estímulos com a mesma intensidade de antes. Além disso, gatos geriátricos muitas vezes sofrem de dores articulares ou letargia, o que reduz a vontade de pular e rolar, mesmo que sintam o cheiro. Nesses casos, a falta de reação pode ser um misto de perda sensorial e limitações físicas. Como veterinário, recomendo usar a erva com cuidado em idosos, monitorando para ver se ela traz conforto ou se apenas causa frustração por não conseguirem interagir fisicamente como gostariam.
Diferenças comportamentais: Cheirar versus Comer
Uma curiosidade que poucos tutores sabem é que a via de administração muda o efeito. O catnip tem uma dualidade interessante: ele atua como um estimulante quando inalado e como um sedativo quando ingerido. Quando o gato cheira a erva seca ou o spray, a nepetalactona atinge o cérebro rapidamente e causa aquela explosão de energia e euforia. É o momento da brincadeira, da corrida pela casa e dos “ataques” aos brinquedos. Esse é o uso mais comum para promover exercício físico.
Por outro lado, se o seu gato tem o hábito de comer a erva seca, você pode notar que ele fica mais relaxado, calmo e até sonolento depois. Ao ser ingerida, a planta tem um efeito levemente sedativo no sistema gástrico e nervoso. Isso pode ser útil em situações de estresse leve, mas é preciso ter moderação. Comer grandes quantidades de planta seca pode causar desconforto gástrico, vômitos ou diarreia em gatos com estômago sensível. Por isso, sempre recomendo oferecer quantidades pequenas e supervisionar a interação.
Entender essa diferença ajuda você a planejar o uso da erva na rotina. Se o objetivo é cansar o gato antes de dormir para que ele não acorde você às três da manhã, estimular o olfato com brinquedos é a melhor estratégia. Se o objetivo é acalmar um gato ansioso antes de uma viagem curta, permitir que ele ingira uma pequena quantidade de folhas frescas ou secas pode ajudar, embora existam nutracêuticos mais eficazes para ansiedade severa. Observar como seu gato interage individualmente — se ele prefere cheirar ou mastigar — permite que você personalize o enriquecimento ambiental para as necessidades dele.
Alternativas naturais para gatos que não reagem ao Catnip
Se o seu gato faz parte da estatística dos 30% que ignoram o catnip, não se preocupe. A natureza oferece outras plantas com compostos similares que podem funcionar onde a nepetalactona falhou. Na minha prática clínica, vejo tutores desistirem de estimulantes olfativos muito cedo, sem saberem que existem opções até mais potentes no mercado.
Silver Vine (Matatabi) e seus efeitos potentes
O Matatabi, ou Silver Vine (Actinidia polygama), é uma planta nativa das regiões montanhosas da Ásia e tem ganhado muita popularidade no ocidente. Estudos mostram que uma porcentagem significativa de gatos que não reagem ao catnip respondem positivamente ao Matatabi. Isso acontece porque o Matatabi contém não apenas um, mas dois componentes ativos estimulantes: a actinidina e a dihidroactinidiolida. Essa combinação cria um “coquetel” químico mais complexo e potente para o olfato felino.
Eu frequentemente recomendo o uso de gravetos naturais de Matatabi para gatos que precisam de estímulo para mastigação e higiene oral. Além da euforia típica (rolar, esfregar, ronronar), a madeira macia da planta ajuda a limpar mecanicamente os dentes enquanto o gato a rói. A reação ao Matatabi tende a ser mais intensa e duradoura do que a do catnip, podendo chegar a trinta minutos de interação. É uma excelente alternativa para gatos apáticos ou com sobrepeso que precisam de motivação extra para se movimentarem.
Vale ressaltar que a segurança do Matatabi é comparável à do catnip. Não há riscos de toxicidade conhecidos quando usado com moderação. A introdução deve ser feita gradualmente. Ofereça um graveto ou um pouco de pó da planta e observe a reação. Muitos tutores relatam que seus gatos parecem entrar em um estado de “transe” focado, o que é um ótimo sinal de enriquecimento mental bem-sucedido.
Valeriana e a estimulação olfativa diferenciada
A raiz de Valeriana (Valeriana officinalis) é outra alternativa poderosa, embora tenha um inconveniente para nós humanos: o cheiro. Enquanto o catnip tem um aroma herbáceo agradável, a raiz de valeriana tem um odor forte que lembra queijo curado ou meias usadas. No entanto, é exatamente esse cheiro pungente que atrai muitos gatos. A valeriana contém actinidina, o mesmo composto encontrado no Matatabi, e atua como um estimulante para gatos quando cheirada.
Diferente do uso humano, onde a valeriana é usada como calmante para dormir, para os gatos o cheiro inicial é energizante. Eles costumam lamber, babar e esfregar o corpo na raiz com muito vigor. Gatos que acham o catnip “fraco” demais muitas vezes se rendem à potência olfativa da valeriana. É uma opção fantástica para variar o cardápio de cheiros da casa e manter o interesse do animal sempre renovado.
Eu sugiro usar brinquedos recheados com raiz de valeriana em vez da erva solta, justamente para conter o cheiro forte e evitar bagunça. Se você mora em um apartamento pequeno, guarde o brinquedo em um pote bem fechado quando não estiver em uso. A alternância entre catnip, matatabi e valeriana cria um ambiente rico e imprevisível, o que é a chave para um gato feliz e mentalmente saudável.
Madressilva tártara como opção de enriquecimento
A Madressilva tártara (Lonicera tatarica) é a opção menos conhecida, mas pode ser a solução para os casos mais difíceis. A madeira desta planta contém um composto que atrai os felinos de forma similar ao catnip. É importante notar que estamos falando da madeira, e não das bagas ou folhas, que podem ser tóxicas. Os brinquedos feitos de madeira de madressilva são seguros e oferecem uma textura diferente para o gato explorar.
Estudos indicam que cerca de 50% dos gatos que não respondem ao catnip podem responder à madressilva. A reação é geralmente mais sutil, envolvendo esfregar as bochechas e o queixo na madeira, o que indica marcação de território e prazer. É uma ferramenta útil para acalmar gatos que estão sendo introduzidos em novos ambientes ou que precisam se sentir mais seguros em seus territórios.
Ao escolher produtos de madressilva, certifique-se de comprar de marcas confiáveis que garantam a origem da madeira. Como veterinário, vejo essa opção como um complemento excelente para o arsenal de enriquecimento ambiental, especialmente para gatos mais sensíveis ou idosos que preferem interações menos explosivas e mais sensoriais.
Mitos e verdades sobre o uso da erva do gato na rotina clínica
No dia a dia da clínica veterinária, escuto muitas preocupações infundadas sobre o uso dessas plantas. É hora de desmistificar algumas crenças populares para que você possa oferecer esses recursos ao seu gato sem culpa ou medo.
A erva do gato vicia ou causa dependência química
Essa é a pergunta número um que recebo: “Doutor, meu gato vai ficar viciado?”. A resposta curta e direta é não. O catnip, assim como o matatabi e a valeriana, não possui componentes viciantes. Não existe síndrome de abstinência felina. Se você parar de oferecer a erva, seu gato não vai tremer, ficar ansioso ou implorar pela substância como aconteceria com drogas opioides em humanos.
O mecanismo de ação é puramente sensorial e temporário. O cérebro do gato responde ao estímulo enquanto ele está presente e retorna ao estado basal assim que o efeito passa. Você pode usar essas ervas como recompensas eventuais sem medo de criar um dependente químico. O que pode acontecer é o gato criar uma associação positiva com o local ou o brinquedo onde a erva é colocada, o que é ótimo para adestramento e modificação comportamental.
Portanto, tire esse peso da consciência. O uso recreativo dessas plantas é uma forma segura e saudável de diversão. Não estamos “drogando” nossos gatos; estamos oferecendo a eles uma experiência sensorial intensa que quebra a monotonia da vida doméstica.
Gatos agressivos ficam mais calmos com a planta
Aqui precisamos ter cuidado. Embora a imagem popular seja a do gato relaxado e “chapado”, a reação inicial ao catnip é de excitação. Em lares com múltiplos gatos, onde já existe tensão ou agressividade latente, oferecer catnip para todos ao mesmo tempo pode, na verdade, desencadear brigas. A nepetalactona reduz a inibição e aumenta a energia. Se um gato já tem tendências agressivas ou territoriais, ele pode redirecionar essa energia excessiva para o outro gato que está ao lado.
Eu sempre oriento meus clientes a testarem a erva com os gatos separados inicialmente. Observe a reação individual. Se o seu gato fica muito agitado e começa a usar as unhas e dentes com força excessiva, ele pode não ser um bom candidato para o uso da erva em momentos de interação social. Nesses casos, o catnip deve ser uma atividade solitária e supervisionada.
Para gatos agressivos por medo ou ansiedade, o efeito calmante só vem na fase pós-euforia ou através da ingestão (que é difícil de controlar). Para agressividade real, precisamos de tratamento comportamental e, às vezes, medicação alopática, não apenas de ervas recreativas. Não use o catnip como um “remédio” para agressão sem consultar um profissional antes.
O efeito perde a potência se usado todos os dias
Isso é verdade e se chama habituação olfativa. Se você deixar o brinquedo com catnip jogado no chão da sala 24 horas por dia, 7 dias por semana, o nariz do seu gato vai se acostumar com o cheiro e o cérebro vai parar de responder. É como quando entramos em uma perfumaria: sentimos os cheiros intensamente nos primeiros minutos, mas depois de um tempo, mal notamos as fragrâncias.
Para manter a “mágica” viva, o segredo é a escassez. O catnip deve ser oferecido apenas duas ou três vezes por semana. Após a brincadeira, recolha os brinquedos e guarde-os em potes herméticos ou sacos zip-lock. Isso preserva a frescura dos óleos essenciais e garante que, na próxima vez que você oferecer, será uma novidade excitante novamente.
Essa rotação é fundamental. Eu recomendo ter um “rodízio” de enriquecimento: segunda-feira é dia de catnip, quarta-feira é dia de varinha de caça, sexta-feira é dia de matatabi. Assim, seu gato nunca sabe o que esperar e o interesse se mantém alto por anos. A gestão do acesso é tão importante quanto a qualidade do produto.
Comparativo de Estimulantes Felinos Naturais
Para facilitar sua escolha na hora de comprar o próximo presente para seu felino, preparei este quadro comparativo com as principais características de cada opção.
| Característica | Catnip (Erva de Gato) | Matatabi (Silver Vine) | Raiz de Valeriana |
| Princípio Ativo | Nepetalactona | Actinidina + Dihidroactinidiolida | Actinidina |
| Potência Estimada | Média | Alta (Mais potente) | Média/Alta |
| Taxa de Reação | ~60-70% dos gatos | ~80% dos gatos | Variável |
| Formas de Uso | Seca, Spray, Planta viva | Gravetos, Pó, Frutos | Raiz seca, Sachês |
| Cheiro para Humanos | Agradável (Hortelã) | Neutro / Suave | Forte (Desagradável) |
| Melhor Indicação | Brincadeiras diárias | Gatos imunes ao catnip | Rotação olfativa |
Agora você tem todas as ferramentas para entender melhor o comportamento do seu gato diante dessas plantas misteriosas. Lembre-se de que cada gato é um indivíduo único com preferências próprias. Se o catnip não funcionou, não desista. Teste o matatabi, experimente a valeriana e observe o que faz os olhos do seu companheiro brilharem. O importante é manter a mente dele ativa e a vida dele interessante.


