Cães sonham? O que a ciência diz
Você já pegou seu cachorro dormindo profundamente e, de repente, viu as patinhas dele se mexendo como se estivesse correndo uma maratona invisível? Ou talvez tenha ouvido aqueles ganidos abafados e engraçadinhos que escapam enquanto ele está “apagado” no sofá? Se você é como a maioria dos pais e mães de pets que atendo na clínica, provavelmente já parou para observar essa cena e se perguntou: “Será que ele está sonhando?”.
Essa é uma das dúvidas mais encantadoras e frequentes que recebo no consultório. É fascinante imaginar que, enquanto descansam, nossos companheiros de quatro patas podem estar vivendo realidades paralelas, perseguindo esquilos imaginários ou talvez – e essa é a minha teoria favorita – ganhando um pote infinito de petiscos. Mas, para além da nossa imaginação, a ciência veterinária e a neurociência já se debruçaram muito sobre esse tema para nos dar respostas concretas.
Neste artigo, vamos mergulhar fundo no universo onírico dos cães. Vou te explicar, de veterinário para tutor, o que realmente acontece no cérebro do seu amigão quando ele fecha os olhos. Prepare-se para descobrir que, sim, o sono do seu pet é muito mais complexo e parecido com o seu do que você imagina.[1] Vamos juntos desvendar esses mistérios?
A Ciência por Trás do Sono Canino[2][3][4][5]
Para entendermos se os cães sonham, precisamos primeiro olhar para a “máquina” que processa tudo isso: o cérebro. A estrutura cerebral dos cães, em nível estrutural, é surpreendentemente semelhante à nossa. Estudos comparativos de ondas cerebrais mostram que, durante o sono, o cérebro do seu cachorro passa por estágios de atividade elétrica quase idênticos aos do cérebro humano. Isso significa que a “fiação” necessária para produzir sonhos está toda lá, instalada e funcionando.
Historicamente, a ciência tendia a acreditar que apenas humanos tinham a capacidade cognitiva de sonhar. No entanto, pesquisas modernas derrubaram essa barreira. Sabemos hoje que a arquitetura do sono nos mamíferos é conservada evolutivamente. Ou seja, a natureza não “inventou” o sonho apenas para nós; ela é uma característica biológica compartilhada. Quando realizamos eletroencefalogramas em cães dormindo, vemos os mesmos padrões de ondas lentas seguidos por atividade frenética que vemos em você ou em mim.
Essa descoberta foi um divisor de águas na medicina veterinária comportamental. Ela nos permitiu parar de olhar para o cachorro como um autômato biológico e passar a vê-lo como um ser senciente com uma vida interior rica. Se o cérebro deles funciona como o nosso enquanto dormem, a conclusão lógica e científica é que a experiência subjetiva – o sonho – também deve ser semelhante.
Ondas cerebrais e a semelhança com os humanos
Quando seu cão adormece, ele não “desliga” simplesmente. O cérebro dele entra em uma dança complexa de frequências elétricas. Inicialmente, ele entra no que chamamos de sono de ondas lentas (SWS – Slow Wave Sleep). É aquele momento em que a respiração dele fica pesada, o corpo relaxa completamente e a atividade cerebral diminui. É o sono reparador físico, essencial para descansar os músculos depois daquele passeio longo no parque.
Porém, o que acontece depois é onde a mágica reside. As ondas cerebrais mudam drasticamente, tornando-se rápidas e irregulares, muito parecidas com as ondas de quando o cão está totalmente acordado e alerta. Se olhássemos apenas para o monitor de atividade cerebral, sem ver o animal, diríamos que ele está acordado, brincando ou resolvendo um problema. Essa atividade intensa em um corpo paralisado pelo sono é o indicativo biológico mais forte de que uma experiência visual e sensorial está ocorrendo na mente do animal.
Essa similaridade com o padrão humano é fundamental para validarmos a existência dos sonhos caninos. Como veterinário, uso essa informação para explicar aos tutores que seu cão não está apenas “gastando tempo” dormindo; ele está processando informações. A biologia não desperdiça energia. Se o cérebro está gastando tanta energia elétrica durante o sono, é porque algo importante – a consolidação de memórias e experiências através dos sonhos – está acontecendo ali.
O papel do estágio REM nos sonhos
Você provavelmente já ouviu falar do sono REM (Rapid Eye Movement, ou Movimento Rápido dos Olhos). É o estágio do sono onde os sonhos mais vívidos e complexos acontecem nos humanos, e nos cães não é diferente. Cerca de 20 minutos após adormecer, seu cão geralmente entra nessa fase. É o momento “cinema” da noite dele. O cérebro ativa o córtex motor e visual, mas um mecanismo de segurança impede que ele saia correndo de verdade.
Durante o REM, uma estrutura no tronco cerebral chamada Ponte de Varólio (ou Pons) envia sinais para paralisar os grandes músculos do corpo. É por isso que seu cachorro não se levanta e bate na parede enquanto sonha que está perseguindo um gato. No entanto, essa paralisia não é perfeita. Pequenos sinais “vazam”, resultando nos espasmos nas patas, no tremor do bigode ou no movimento dos olhos sob as pálpebras fechadas.
Para nós, profissionais da saúde animal, o sono REM é um indicador de saúde mental e bem-estar. Um cão que atinge o sono REM com frequência e qualidade está conseguindo processar suas emoções e aprendizados. Se você observar seu cão tendo esses movimentos oculares rápidos, pode ter certeza: ele está no auge da sua atividade onírica, vivendo uma “realidade virtual” criada pelo próprio cérebro.
Evidências científicas: Estudos com ratos e a estrutura do cérebro
A confirmação mais robusta sobre o conteúdo dos sonhos animais veio, curiosamente, de estudos com ratos, que depois foram extrapolados para cães devido às semelhanças neurológicas. Pesquisadores do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) monitoraram a atividade cerebral de ratos enquanto eles percorriam um labirinto durante o dia. Eles mapearam exatamente quais neurônios disparavam em quais partes do labirinto.
Quando esses mesmos ratos dormiram, os cientistas observaram algo incrível: os mesmos padrões de neurônios dispararam na mesma ordem exata. O cérebro dos ratos estava “repeteindo” o percurso do labirinto durante o sono REM. A precisão era tamanha que os pesquisadores podiam dizer em que parte do labirinto o rato estava “sonhando” estar, apenas olhando para o monitor.
Como o cérebro do cão é muito mais complexo que o do rato e ainda mais próximo do humano, a comunidade científica aceita que os cães fazem o mesmo. Eles “repassam” as atividades do dia. Se o seu cão aprendeu um truque novo como “senta” ou “fica”, é muito provável que, durante o sono REM daquela noite, o cérebro dele esteja repetindo a sequência neural desse aprendizado, fixando a memória através do sonho.
Com o Que os Cães Sonham, Afinal?
Agora que já estabelecemos que eles sonham, a pergunta de um milhão de dólares é: com o que eles sonham? Diferente de nós, que podemos sonhar com monstros imaginários, voar ou situações abstratas, a mente canina é muito mais concreta e sensorial. Eles não assistem a filmes de ficção científica; eles reeditam documentários da própria vida.
A “matéria-prima” dos sonhos do seu cachorro é a vida dele. Como veterinário, costumo dizer que os cães são seres de rotina e de olfato. O mundo deles é construído através do que cheiram, veem e interagem. Portanto, os sonhos deles são colagens dessas experiências sensoriais. Não espere que seu Pug sonhe com a bolsa de valores ou com a paz mundial, mas tenha certeza de que o sonho dele é intenso e cheio de significado para a realidade canina.
Vamos explorar os temas mais comuns que povoam a mente do seu pet enquanto ele dorme. A ciência nos dá pistas fascinantes de que, muito provavelmente, o protagonista dos sonhos dele é alguém que você conhece muito bem: você.
Revivendo as aventuras do dia a dia
O conceito principal aqui é a continuidade. Os sonhos dos cães funcionam como uma extensão da vigília. Se o seu cão passou a tarde correndo atrás de uma bola de tênis, o cérebro dele registrou a excitação, o movimento muscular, o cheiro da grama e a textura da bola. À noite, durante o sono, ele revive esses momentos para processar as informações.
Isso explica por que cães de caça, como Pointers ou Beagles, muitas vezes “apontam” ou farejam intensamente enquanto dormem. Eles estão sonhando com o trabalho instintivo deles. Já vi cães pastores, como Border Collies, moverem as patas de forma coordenada, como se estivessem cercando ovelhas em seus sonhos. O cérebro está praticando habilidades essenciais para a sobrevivência ou para a função que a raça foi desenvolvida para exercer.
Para o seu cão doméstico, as “aventuras” podem ser mais simples, mas não menos emocionantes para ele. Latir para o carteiro, cheirar aquele poste novo na esquina ou brincar de cabo de guerra. Tudo isso é material de sonho. É reconfortante pensar que, quando seu cão está dormindo tranquilo, ele pode estar apenas curtindo novamente aquele passeio gostoso que vocês fizeram juntos pela manhã.
A conexão com os donos até no sono
Aqui entra a parte que derrete o coração de qualquer tutor. Pesquisas da Harvard Medical School sugerem que, como os cães são extremamente apegados aos seus humanos (muito mais do que gatos, por exemplo, que são mais independentes), é altamente provável que você seja o foco principal dos sonhos do seu cachorro.
A lógica é simples: o sonho processa as experiências emocionais mais fortes do dia. Para um cão, você é o centro do universo, a fonte de alimento, segurança e carinho. O rosto do dono, o cheiro do dono e a voz do dono são os estímulos mais importantes na vida de um cão. Portanto, quando ele fecha os olhos, ele não sonha com paisagens vazias; ele sonha com a interação que teve com você.
Imagine que, naquele momento em que ele abana o rabo dormindo, ele pode estar sonhando que você chegou em casa do trabalho, ou que você está fazendo aquele carinho atrás da orelha que ele adora. Saber disso reforça ainda mais o vínculo que temos com eles. Nós cuidamos deles acordados, e eles nos mantêm vivos em suas memórias enquanto dormem.
Pesadelos existem no mundo canino?
Infelizmente, nem tudo são flores no mundo dos sonhos. Assim como nós, os cães podem ter experiências negativas durante o sono. Se os sonhos são reflexos do dia a dia, medos, traumas e estresses também podem ser “reprocessados” à noite. Um cão que tem medo de trovões, por exemplo, pode reviver a ansiedade de uma tempestade durante o sono.
Você consegue identificar um provável pesadelo pela linguagem corporal. Enquanto um sonho bom pode vir acompanhado de abanos de rabo e “corridinhas” relaxadas, um pesadelo pode manifestar-se com choramingos agudos, rosnados defensivos ou até mesmo o animal acordar assustado e ofegante. Cães resgatados com histórico de maus-tratos podem ter pesadelos com mais frequência no início da sua vida em um novo lar seguro.
Como veterinário, aconselho: se você desconfiar que seu cão está tendo um pesadelo, o instinto é acordá-lo para “salvá-lo”. Mas tenha cuidado. Acordar bruscamente um animal que está revivendo um medo pode ativar um reflexo de defesa, e ele pode morder por desorientação antes de perceber que é você. O ideal é falar suavemente de longe ou deixar o pesadelo passar naturalmente – geralmente eles são curtos.
Sinais Físicos de que Seu Pet Está Sonhando
Observar um cão dormindo é quase um esporte para quem ama animais. Mas você sabe distinguir o que é um movimento normal de sono de algo que poderia ser preocupante? O corpo do cão dá sinais muito claros quando entra no mundo dos sonhos, e aprender a lê-los ajuda você a monitorar a qualidade do descanso do seu pet.
Esses sinais são o resultado daquela “falha” proposital no bloqueio muscular que mencionei anteriormente. É como se o cérebro estivesse gritando as ações tão alto que os músculos acabam obedecendo um pouquinho. Para nós veterinários, esses sinais são ótimos indicativos de que o ciclo do sono está se completando de forma saudável.
Vamos detalhar o que você deve procurar. É um espetáculo de neurobiologia acontecendo bem no tapete da sua sala, e entender cada tremidinha vai te conectar ainda mais com a natureza do seu animal.
O que significam os espasmos e latidos abafados
Os espasmos musculares (mioclonias) são os sinais mais clássicos. Você verá as patas dianteiras ou traseiras se contraírem ritmicamente. Muitas vezes, isso é interpretado como “correr atrás de coelhos”, e a ciência diz que essa interpretação está provavelmente correta. Os neurônios motores responsáveis pela locomoção estão disparando no cérebro.
Já os sons são ainda mais curiosos. Muitos cães emitem latidos que parecem vir de dentro de uma caixa, ganidos curtos ou até movimentos de sucção (comuns em filhotes que sonham que estão mamando). Esses sons vocais indicam que o sonho envolve comunicação ou interação. O cão está “falando” com algo ou alguém em seu sonho.
Não se preocupe se esses movimentos parecerem um pouco desajeitados ou se o cachorro estiver de boca aberta e língua de fora. O relaxamento muscular total da face durante o sono profundo, combinado com esses espasmos, pode criar caretas engraçadas, mas são totalmente normais e inofensivas.
Movimento rápido dos olhos (REM) na prática
Se você tiver coragem e delicadeza para chegar bem perto do seu cão dormindo (sem tocá-lo para não acordar), observe as pálpebras. Durante a fase de sonho intenso, você verá os globos oculares se movendo freneticamente por baixo da pele. Eles podem ir de um lado para o outro ou de cima para baixo.
Esse movimento não é aleatório. Estudos em humanos sugerem que os olhos seguem a ação do sonho. Se o cão está sonhando com uma bola sendo jogada para o alto, os olhos podem se mover para cima. Se está escaneando o horizonte, os olhos se movem lateralmente. É a prova física de que ele está “vendo” imagens geradas internamente.
A fase REM é cíclica. Ela não dura a noite toda. Geralmente, ela acontece em ondas. Você vai notar que seu cão tem momentos de quietude total (sono de ondas lentas) intercalados com esses momentos de “agitação ocular” e corporal (sono REM). Monitorar se seu cão entra nessas fases é um bom indicativo de que ele está descansando bem.
Diferenças entre sonhar e ter uma convulsão
Aqui entra um ponto crucial de saúde. Muitos tutores de primeira viagem se assustam ao ver um sonho muito intenso e correm para o telefone para me ligar achando que o cão está tendo uma convulsão. É vital saber a diferença, pois uma é um processo fisiológico delicioso e a outra é uma emergência médica.
Um cão sonhando pode ter espasmos, mas se você chamar o nome dele ou fizer um barulho, ele vai acordar (pode ficar meio grogue, mas acorda). Ele está relaxado entre os espasmos, e o movimento tende a ser curto, durando segundos ou poucos minutos. A respiração pode variar, mas não fica agônica.
Já numa convulsão, o cão não acorda se você chamá-lo. O corpo fica rígido e tenso, não relaxado. Os movimentos são violentos e repetitivos, muitas vezes acompanhados de salivação excessiva, perda de controle da bexiga ou intestino e, após o evento, o animal fica extremamente desorientado por um longo tempo. Se você notar rigidez, incapacidade de despertar ou salivação espumosa, procure um veterinário imediatamente. Mas se for apenas uma “corridinha” deitado seguida de um suspiro, relaxe: é só um sonho bom.
Fatores que Influenciam os Sonhos: Idade e Tamanho
Você sabia que nem todos os cães sonham na mesma frequência? A biologia do sono canino não é “tamanho único”. Existem variações fascinantes que dependem de quão grande é o cérebro do seu cachorro e em que estágio da vida ele está. Na clínica, observo padrões muito distintos entre um filhote de Golden Retriever e um Poodle idoso.
Essa variação acontece porque o propósito do sono muda ligeiramente com a idade e o metabolismo. Entender isso ajuda você a ter mais paciência com seu filhote que dorme o dia todo ou a compreender as necessidades de descanso do seu cão velhinho.
Vamos quebrar esses fatores para que você saiba exatamente o que esperar do seu pet específico. A regra geral é: quanto mais atividade de aprendizado e crescimento, mais sonhos.
Por que filhotes e idosos sonham mais?
Filhotes são máquinas de aprender. Tudo para eles é novo: a grama, a escada, o gosto da ração, o cheiro do outro cachorro. O cérebro deles está bombando de novas informações que precisam ser organizadas e armazenadas. Por causa dessa carga imensa de dados novos, os filhotes passam muito mais tempo em sono REM do que cães adultos. Eles precisam sonhar para “salvar” o que aprenderam. É como se estivessem fazendo o download das atualizações do sistema a cada soneca.
No outro extremo da vida, os cães idosos também tendem a ter mais atividade visível de sonho, mas por um motivo diferente. Com a idade, a parte do cérebro (o tronco cerebral) que inibe os movimentos musculares durante o sono pode ficar um pouco menos eficiente. O “freio” fica frouxo.
Isso significa que, mesmo que sonhem a mesma quantidade que um adulto, os idosos “atuam” mais seus sonhos fisicamente. Eles se mexem mais, latem mais e podem parecer mais agitados dormindo. Isso é normal do envelhecimento neurológico, desde que não atrapalhe o descanso geral deles.
Raças pequenas vs. raças grandes: A frequência dos sonhos
Esta é uma das curiosidades mais interessantes da ciência do sono animal. O tamanho do cachorro influencia o “roteiro” do sonho. Pesquisas indicam que cães pequenos (como Chihuahuas ou Yorkies) têm sonhos mais frequentes, porém mais curtos. Eles podem entrar em fase de sonho a cada 10 minutos.
Já os cães grandes (como Labradores ou Dogues Alemães) têm um ciclo mais longo. Eles podem sonhar apenas uma vez a cada 60 ou 90 minutos, mas os sonhos duram muito mais tempo – podem ficar 5 ou 10 minutos seguidos sonhando.
Ainda não sabemos exatamente por que isso acontece, mas suspeita-se que tenha a ver com a taxa metabólica. Cães pequenos têm metabolismo acelerado, e isso pode se refletir em ciclos de sono mais rápidos. Então, se você tem um pinscher, ele provavelmente está tendo vários “curtas-metragens” durante a noite, enquanto seu vizinho com um São Bernardo está assistindo a um “longa-metragem” épico.
O impacto da atividade diária na qualidade do sono
Como veterinário, não posso deixar de reforçar: um cão cansado é um cão que sonha bem. A qualidade do sono do seu pet está diretamente ligada à qualidade da vida dele quando acordado. Cães que passam o dia todo sem fazer nada, entediados no sofá, tendem a ter um sono mais fragmentado e menos reparador.
Por outro lado, cães que têm enriquecimento ambiental – passeios, brincadeiras, desafios mentais, cheiros novos – têm muito mais “material” para processar. Eles entram em sono profundo mais rápido e permanecem nele por mais tempo.
Se você quer garantir que seu cão tenha bons sonhos, garanta que ele tenha bons dias. A atividade física libera neurotransmissores que facilitam o relaxamento, e a atividade mental dá ao cérebro o trabalho saudável de consolidar memórias à noite. O sono é o reflexo da vigília.
O Papel do Veterinário e do Tutor no Sono do Pet
Nós, como cuidadores, temos uma responsabilidade ativa no descanso dos nossos animais. O sono não é apenas um tempo ocioso; é um pilar da saúde, tão importante quanto a vacinação ou a nutrição adequada. Na minha prática clínica, vejo muitos problemas comportamentais (como ansiedade e agressividade) que melhoram significativamente quando ajustamos a rotina de sono do animal.
Você tem o poder de influenciar diretamente a qualidade de vida do seu pet através do sono. Não se trata apenas de comprar uma cama fofa, mas de entender a biologia e respeitar os limites do animal.
Aqui estão algumas diretrizes práticas para você aplicar em casa hoje mesmo e transformar as noites do seu cão.
A importância de não acordar um cão sonhando
Existe um ditado antigo em inglês que diz “let sleeping dogs lie” (deixe os cães adormecidos quietos), e ele tem total respaldo veterinário. Interromper o ciclo de sono REM, especialmente de forma brusca, é prejudicial. O cérebro está no meio de um processo químico importante.
Acordar um cão no susto provoca um pico de cortisol (hormônio do estresse). Se isso for feito repetidamente, você pode ter um cão irritadiço, ansioso e até com o sistema imunológico comprometido. Além disso, como mencionei antes, existe o risco real de uma reação de mordida por reflexo.
Ensine a todos na casa, especialmente às crianças, que a hora do sono é sagrada. O cão não deve ser o brinquedo disponível 24 horas por dia. Se ele está dormindo, ele está “offline” para manutenção. Respeite esse espaço. Se precisar acordá-lo por algum motivo urgente, use a voz baixa, chame pelo nome suavemente e evite tocá-lo até que ele abra os olhos e foque em você.
Criando um ambiente propício para bons sonhos
O ambiente faz toda a diferença. Assim como você dorme mal com luz na cara ou barulho, seu cão também. Crie um “santuário do sono”. O local deve ser tranquilo, longe da passagem constante de pessoas e protegido de correntes de ar frias ou calor excessivo.
A escolha da cama é fundamental. Um cão que sente dor nas articulações (comum em idosos e raças grandes) não vai conseguir relaxar o suficiente para entrar em sono REM profundo se a cama for dura. Investir no conforto físico é investir na saúde mental do seu cão.
Aqui está um comparativo simples para te ajudar a escolher a melhor opção para o sono do seu pet:
| Tipo de Cama | Nível de Conforto | Impacto no Sono Profundo | Indicado para |
| Cama Ortopédica | Alto (Espuma de memória) | Excelente (Alivia pressão articular, facilita o sono sem dor) | Cães idosos, com artrite ou raças grandes. |
| Cama Comum de Espuma | Médio | Bom (Oferece isolamento térmico e maciez básica) | Cães jovens e saudáveis sem problemas articulares. |
| Colchonete Simples | Baixo | Regular (Pode ser insuficiente para isolar do chão duro/frio) | Viagens curtas ou uso temporário; não ideal para sono noturno. |
Quando procurar ajuda profissional (distúrbios do sono)
Por fim, fique atento ao excesso. Cães dormem muito (cerca de 12 a 14 horas por dia), mas mudanças drásticas nesse padrão podem indicar problemas. Se seu cão está dormindo o dia inteiro e não tem energia para passear (letargia), ou se ele passa a noite em claro vagando pela casa (insônia ou disfunção cognitiva em idosos), é hora de visitar o veterinário.
Existem distúrbios do sono em cães, como a narcolepsia (ataques súbitos de sono) e a apneia do sono (comum em cães de focinho achatado como Pugs e Buldogues, que roncam alto e param de respirar momentaneamente). Essas condições afetam a oxigenação do cérebro e a qualidade de vida.
Se você notar que o sono do seu pet não parece reparador, ou se os comportamentos durante o sono forem excessivamente violentos ou frequentes, filme com o celular e leve para a consulta. Esse vídeo é uma ferramenta diagnóstica valiosa para nós. O sono deve ser um momento de paz, e cabe a nós garantir que nossos amigos tenham os sonhos doces que merecem.
Espero que este artigo tenha ajudado você a entender melhor o mundo secreto que seu cão visita todas as noites. Agora, da próxima vez que vir aquelas patinhas se mexendo, você saberá exatamente a ciência maravilhosa que está acontecendo ali. Bons sonhos para você e para seu peludo!


