Cachorro pode comer maçã? O Guia Definitivo do Veterinário para Tutores
É muito comum, durante as consultas de rotina aqui na clínica, que os tutores me perguntem sobre a diversificação da dieta. Você está lá na cozinha, cortando uma fruta para o lanche da tarde, e sente aquele olhar pidão vindo de baixo. Aquele olhar que te convence a compartilhar qualquer coisa. Mas quando se trata de maçã, a dúvida sempre surge: será que posso oferecer um pedaço? Será que vai fazer mal para o estômago dele?
A resposta curta e direta para aliviar sua preocupação é sim, cachorros podem comer maçã. Na verdade, essa é uma das frutas mais seguras e recomendadas que prescrevemos como petisco natural. Ela é palatável, tem uma textura crocante que a maioria dos cães adora e possui um perfil nutricional muito interessante. No entanto, como tudo na medicina veterinária, existem regras de segurança. Não basta jogar a fruta inteira para o animal e esperar pelo melhor. Existem partes da maçã que são tóxicas e quantidades que podem transformar um benefício em uma dor de barriga.
O segredo está no modo de preparo e na moderação. Entender a fisiologia do seu cão e como ele processa os alimentos vegetais é fundamental. Diferente de nós, o trato digestivo deles é mais curto e preparado para proteínas, mas isso não significa que eles não se beneficiem das vitaminas das frutas. Vou explicar detalhadamente, de médico para tutor, como transformar a maçã em uma aliada da saúde do seu melhor amigo, sem correr riscos desnecessários.
O Veredito Nutricional: Por que a Maçã é uma Aliada?
O poder das vitaminas A e C na imunidade canina
Quando indicamos a maçã, não estamos pensando apenas em um agrado saboroso, mas sim em um complemento vitamínico natural. A maçã é uma fonte decente de Vitamina A e Vitamina C. Embora o organismo do cão seja capaz de sintetizar a vitamina C no fígado — diferentemente dos humanos que precisam ingeri-la obrigatoriamente — uma dose extra vinda de fontes naturais pode ser benéfica, especialmente para cães idosos ou que estão passando por estresse fisiológico. Essa vitamina atua na redução da inflamação e no combate aos radicais livres.
A Vitamina A presente na fruta desempenha um papel crucial na saúde da pele e da pelagem, além de ser vital para o funcionamento da retina. Vejo muitos pacientes com pelagem opaca que, após um ajuste nutricional adequado que inclui fontes naturais de vitaminas, apresentam uma melhora visível no brilho e na textura do pelo. A maçã oferece esse suporte de forma leve, sem a carga calórica de suplementos gordurosos que muitas vezes são vendidos em pet shops sem necessidade real.
Além disso, essas vitaminas trabalham em conjunto para fortalecer o sistema imunológico. Um cão com boa ingestão de micronutrientes tem uma resposta melhor a vacinas e combate infecções de forma mais eficiente. Claro que a maçã não substitui uma ração de alta qualidade, mas ela entra como um reforço tático. É aquele “algo a mais” que você oferece sabendo que está contribuindo para a biologia interna do seu animal, e não apenas enchendo a barriga dele com calorias vazias.
Fibras solúveis e o funcionamento intestinal
Um dos maiores benefícios da maçã é o seu teor de fibras, especificamente a pectina. A pectina é uma fibra solúvel que atua de maneira fantástica no intestino dos cães. Ela funciona como um prebiótico, ou seja, serve de alimento para as bactérias boas que vivem no cólon do animal. Manter essa flora intestinal equilibrada é essencial para evitar episódios de diarreia e garantir que a absorção de nutrientes da ração principal seja feita com eficiência máxima.
Para cães que sofrem de constipação leve ou fezes muito ressecadas, a fibra da maçã ajuda a reter água no bolo fecal, facilitando o trânsito intestinal e a defecação. É uma forma natural de regular o intestino sem recorrer a medicamentos laxantes que podem ser agressivos se usados a longo prazo. Eu costumo recomendar pedaços de maçã para pacientes que precisam de um pouco mais de volume nas fezes para estimular o peristaltismo, que são os movimentos naturais do intestino.
Por outro lado, a fibra também ajuda na saciedade. Cães que estão em programas de perda de peso — e a obesidade canina é uma epidemia que vejo todos os dias no consultório — se beneficiam muito da maçã. A fibra ocupa espaço no estômago, enviando ao cérebro a mensagem de que o animal está cheio, sem fornecer a quantidade massiva de calorias que um biscoito industrializado forneceria. É uma ferramenta estratégica para quem precisa colocar o pet em dieta sem fazê-lo passar fome.
Antioxidantes e a prevenção do envelhecimento celular
O envelhecimento é um processo oxidativo. Basicamente, as células do corpo do seu cão vão “enferrujando” com o tempo devido à ação dos radicais livres. A maçã contém compostos polifenólicos e flavonoides que são poderosos antioxidantes. Esses elementos ajudam a proteger as células contra danos degenerativos. Pensando a longo prazo, inserir antioxidantes na dieta desde cedo pode contribuir para uma velhice com mais qualidade de vida e menor incidência de doenças crônicas.
Em cães senis, a degeneração cognitiva é uma preocupação real. Eles começam a esquecer comandos, ficam desorientados ou alteram o ciclo de sono. Estudos sugerem que uma dieta rica em antioxidantes pode retardar esse declínio cognitivo. Oferecer maçã como petisco ao longo da vida é uma forma preventiva de cuidar da saúde cerebral do seu cão. Não é uma cura mágica, mas é um tijolo na construção de uma saúde sólida.
Além disso, esses antioxidantes têm papel na saúde articular. Muitos cães grandes sofrem de displasia ou artrite. A inflamação crônica é a vilã nesses casos. Alimentos anti-inflamatórios naturais ajudam a manter o corpo menos inflamado. Ao escolher a maçã em vez de um petisco processado cheio de corantes e conservantes (que são pró-inflamatórios), você está fazendo uma escolha ativa pela longevidade e pelo conforto do seu animal.
O Perigo Oculto: O Que Você Precisa Saber Sobre as Sementes
Entendendo a toxicidade do cianeto (amigdalina)
Aqui entramos na parte mais séria da conversa e onde eu preciso que você preste total atenção. O miolo da maçã e, principalmente, as sementes contêm uma substância chamada amigdalina. Quando as sementes são mastigadas e trituradas pelo cão, essa substância é liberada e, no processo de digestão, converte-se em cianeto de hidrogênio. Sim, cianeto, um veneno potente.
Muitos tutores me dizem: “Doutor, mas meu cachorro comeu uma semente sem querer e não morreu”. É verdade. A quantidade de cianeto em uma única semente é pequena e o organismo consegue detoxificar quantidades minúsculas. O problema é o acúmulo e a ingestão acidental de grandes quantidades. O risco não vale a pena. Para cães de porte muito pequeno, a margem de segurança é menor. Não existe motivo para expor o fígado e o sistema nervoso do seu animal a uma toxina, mesmo que em baixas doses.
A ingestão crônica, ou seja, dar maçã com semente todo dia, pode sobrecarregar o sistema do animal ao longo do tempo. O cianeto impede que as células utilizem o oxigênio adequadamente. É uma asfixia celular. Por isso, a regra no meu consultório é clara e inegociável: maçã apenas sem o miolo e sem nenhuma semente. Se cair uma no chão, corra para pegar antes dele.
O risco mecânico e a obstrução em cães pequenos
Além da toxicidade química, existe o risco físico. O miolo da maçã é duro, fibroso e difícil de digerir. Para cães de raças pequenas ou braquicefálicos (aqueles de focinho curto como Pugs e Buldogues), engolir um pedaço grande do miolo pode causar engasgos sérios. A traqueia e o esôfago desses animais não são projetados para lidar com estruturas tão rígidas e irregulares.
Já atendi casos de emergência onde o cão estava sufocando não com um brinquedo, mas com pedaços de alimentos inadequados. O miolo, por ser arredondado e duro, pode se alojar na garganta, bloqueando a passagem de ar. É uma situação de pânico tanto para o animal quanto para o dono, e que pode ser fatal em questão de minutos se não houver socorro imediato.
Mesmo que o pedaço passe pela garganta, ele pode causar uma obstrução intestinal mais à frente. Se o miolo ficar preso no intestino delgado, ele para o trânsito das fezes, causa necrose na alça intestinal e exige cirurgia de emergência para retirada. É um risco altíssimo por pura falta de cuidado no preparo. Cortar a maçã e retirar o centro leva trinta segundos e previne um cenário cirúrgico complexo.
Sintomas de intoxicação para ficar alerta
Caso aconteça um acidente e seu cão coma uma quantidade considerável de sementes (por exemplo, ele roubou várias maçãs da fruteira e comeu tudo), você precisa saber identificar os sinais de alerta. Os sintomas de envenenamento por cianeto incluem pupilas dilatadas, gengivas muito vermelhas (vermelho tijolo) devido à oxigenação inadequada do sangue nos tecidos, e dificuldade respiratória, onde o cão fica ofegante sem ter feito exercício.
Em casos mais graves, o animal pode apresentar tremores, convulsões e colapso. Se você notar qualquer comportamento estranho após a ingestão de maçãs inteiras, não espere “para ver se passa”. A intervenção veterinária rápida com oxigenoterapia e fluidos é crucial para a sobrevivência. O tempo é o inimigo nesses casos de intoxicação aguda.
Também fique atento a vômitos e diarreia. Embora possam ser apenas uma indigestão pela quantidade de fibras, se vierem acompanhados de letargia (o cão ficar muito “murcho” e quieto), é sinal de que o organismo está lutando contra algo mais sério. Conhecer o comportamento normal do seu cão é a melhor ferramenta de diagnóstico inicial que você tem em casa.
Com Casca ou Sem Casca? A Dúvida Comum no Consultório
A concentração de nutrientes na casca
A casca da maçã é onde reside a maior concentração de fitonutrientes e a maior parte das fibras insolúveis. Muitos tutores têm o hábito de descascar tudo, achando que estão facilitando a vida do cão, mas ao fazer isso, você está jogando fora uma boa parte dos benefícios que discutimos antes. A casca contém ácido ursólico, que estudos preliminares indicam ter potencial para ajudar na saúde muscular e no controle da gordura corporal.
Para um cão saudável, adulto e com a dentição em dia, comer a maçã com casca é perfeitamente aceitável e até recomendado. A textura da casca oferece uma experiência sensorial diferente. Cães exploram o mundo pela boca, e texturas variadas enriquecem o dia a dia deles, evitando o tédio alimentar que ocorre quando só comem a mesma ração seca marrom todos os dias da vida.
No entanto, a casca precisa estar íntegra. Não ofereça cascas machucadas, com fungos ou pontos pretos de apodrecimento. O sistema digestivo do cão é resistente, mas fungos produzem micotoxinas que podem causar problemas hepáticos graves. Se a maçã não está boa para você comer, definitivamente não está boa para o seu cachorro.
A importância da higienização e os agrotóxicos
O grande “porém” da casca são os agrotóxicos. A maçã figura frequentemente nas listas de frutas com maior carga de pesticidas. O corpo do cão é menor que o nosso, o que significa que a concentração de toxinas por quilo de peso corporal é maior neles ao ingerir a mesma quantidade de fruta. A exposição contínua a esses químicos pode sobrecarregar os rins e o fígado do animal a longo prazo.
Por isso, a higienização não é opcional, é obrigatória. Lave a maçã com água corrente e uma escovinha própria para alimentos. Se possível, deixe de molho em uma solução de hipoclorito ou bicarbonato adequada para limpeza de vegetais. Melhor ainda: se o seu orçamento permitir, opte por maçãs orgânicas quando for dividir com seu pet.
Se você não tem certeza da procedência da fruta e ela parece estar coberta por aquela cera artificial para ficar brilhante na prateleira do mercado, a decisão mais segura e conservadora é descascar. É preferível perder um pouco de fibra do que ingerir uma carga desconhecida de produtos químicos e ceras sintéticas que não foram feitas para o estômago canino.
Quando descascar é a melhor opção clínica
Existem situações específicas onde eu, como veterinário, recomendo retirar a casca. A primeira delas é para filhotes muito jovens que estão começando a introdução de petiscos. O sistema digestivo deles ainda é imaturo e a fibra dura da casca pode causar um pouco de cólica ou soltar o intestino mais do que o desejado.
A segunda situação é para cães idosos com problemas dentários ou falta de dentes. A casca pode grudar no céu da boca ou ser difícil de mastigar, criando um incômodo que faz o animal rejeitar o alimento. Para esses velhinhos, queremos facilitar ao máximo a ingestão de nutrientes, então oferecer a polpa macia ou até levemente cozida é o ideal.
Também recomendo descascar para cães que têm histórico de gastrite ou sensibilidade gástrica severa. A digestão da casca exige mais ácido estomacal e mais trabalho mecânico do estômago. Se o órgão já está sensibilizado, queremos dar o mínimo de trabalho possível. Nesses casos, a maçã sem casca funciona como um alimento leve e de fácil digestão, similar à dieta de frango com batata que prescrevemos para cães convalescentes.
Quantidade e Frequência: A Regra de Ouro da Alimentação
A matemática dos 10% na dieta do seu pet
Essa é a regra mais importante da nutrição clínica de pequenos animais: os petiscos nunca devem ultrapassar 10% das calorias diárias totais do seu cão. A ração comercial de boa qualidade já é balanceada com precisão milimétrica. Quando você adiciona extras, você desbalanceia essa equação. Se os extras forem mais que 10%, seu cão pode começar a ter deficiências nutricionais porque ele vai comer menos ração para compensar, ou, o que é mais provável, vai ficar obeso.
A maçã tem açúcar (frutose). É um açúcar natural, mas ainda é energia. Se você der uma maçã inteira para um cão de 5kg, você está dando uma carga calórica imensa proporcionalmente ao tamanho dele. Seria como se você comesse cinco ou seis maçãs de uma vez. O excesso de energia que não é gasto vira gordura, e a obesidade traz problemas articulares, cardíacos e respiratórios.
Você não precisa de uma balança de precisão e uma calculadora científica na cozinha toda vez. O bom senso prevalece. Mas tenha em mente que a maçã é um agrado, um “bônus”, e não o prato principal. Ela entra para dar sabor e alegria, não para sustentar o animal nutricionalmente.
Ajustando a porção para diferentes portes e idades
Para tornar isso prático para você, vamos falar em fatias. Para um cão de porte miniatura ou pequeno (como um Yorkshire ou um Spitz), um ou dois cubinhos de maçã (do tamanho da ponta do seu dedo) são suficientes por dia. Não precisa ser a fatia inteira. Pique pequeno. Isso também ajuda a fazer o petisco render mais em sessões de treinamento.
Para cães de médio porte (como um Beagle ou Cocker Spaniel), duas a três fatias finas são uma boa medida. Já para os grandões (Labradores, Goldens, Pastores), você pode oferecer meia maçã, fatiada ou em cubos, sem problemas, desde que eles sejam ativos. Lembre-se sempre de ajustar a quantidade de ração no final do dia se você pesou a mão nos petiscos.
A idade também influi. Filhotes têm um metabolismo acelerado, mas intestinos sensíveis. Comece com um pedacinho minúsculo e observe as fezes no dia seguinte. Se estiverem firmes, pode continuar. Idosos tendem a ser menos ativos, ou seja, queimam menos calorias. Para eles, a moderação deve ser ainda maior para evitar o ganho de peso, que é terrível para as articulações já cansadas.
O perigo do excesso e a fermentação gástrica
O que acontece se você der muita maçã? O primeiro sinal será gastrointestinal. O excesso de fibras e frutose atrai água para o intestino, causando diarreia osmótica. Além disso, as bactérias do intestino fermentam esse açúcar, produzindo gás. Seu cão pode ter flatulência (gases), cólicas e desconforto abdominal visível (ficar se esticando, barriga fazendo barulho).
Em cães de porte grande e peito profundo, temos sempre o medo da torção gástrica, embora ela seja geralmente associada a grandes volumes de comida e água seguidos de exercício. No entanto, qualquer alimento que produza muito gás no estômago deve ser oferecido com cautela. Evite dar frutas logo antes ou logo depois de exercícios intensos.
Se o seu cão invadiu a cozinha e comeu um saco de maçãs, o protocolo é jejum alimentar por algumas horas para deixar o estômago assentar e observação. Ofereça água à vontade. Se os vômitos começarem e não pararem, ou se a barriga ficar muito distendida e dura ao toque, corra para o veterinário. O excesso de fermentação pode ser muito doloroso.
Receitas e Formas Criativas de Ofertar
Maçã congelada: Enriquecimento ambiental e alívio no calor
Vivemos em um país tropical e nossos cães sofrem com o calor. Uma técnica excelente que recomendo é congelar cubinhos de maçã. Corte a fruta em pedaços pequenos, retire sementes e casca (se preferir), coloque em uma forma e leve ao freezer. Oferecer esses cubinhos gelados nos dias quentes ajuda a baixar a temperatura corporal e diverte o cão.
A textura muda quando congelada, tornando o petisco mais duro, o que exige que o cão mastigue mais ou lamba, gastando energia mental. Isso é o que chamamos de enriquecimento ambiental. Você transforma o ato de comer em uma atividade lúdica. É ótimo para cães ansiosos que precisam se ocupar enquanto você está trabalhando em casa.
Você também pode colocar pedaços de maçã dentro de brinquedos recheáveis (tipo Kong) e completar com um pouco de água ou caldo de carne natural (sem sal e sem cebola) e congelar. Isso cria um “picolé” dentro do brinquedo que vai manter seu cão entretido por trinta ou quarenta minutos, lambendo para tirar a fruta lá de dentro.
Mix funcional: Maçã com iogurte natural e probióticos
Para um lanche super nutritivo, você pode misturar maçã picadinha com iogurte natural integral (aquele que só tem leite e fermento, sem açúcar, sem adoçantes e sem sabor). O iogurte é uma fonte excelente de cálcio e bactérias benéficas. A combinação da fibra prebiótica da maçã com os probióticos do iogurte é uma bomba de saúde para o intestino.
Essa mistura pode ser oferecida na própria vasilha de comida ou usada como um “topper” sobre a ração seca para torná-la mais atrativa. Cães que estão enjoados da ração costumam aceitar muito bem essa novidade. A acidez do iogurte com o doce da maçã é muito palatável para o paladar canino.
Apenas certifique-se de que seu cão não é intolerante à lactose. Comece com uma colher de chá de iogurte. A maioria dos cães tolera bem o iogurte porque o processo de fermentação reduz a lactose, mas é sempre bom testar antes de oferecer uma tigela cheia.
Biscoitos assados de maçã e aveia para treinos
Se você gosta de cozinhar, fazer seus próprios petiscos é a forma mais segura de saber exatamente o que seu cão está comendo. Uma receita clássica que prescrevo é misturar purê de maçã (maçã cozida e amassada, sem açúcar) com aveia em flocos e um pouco de farinha de arroz ou integral.
Misture até formar uma massa que não grude nas mãos, abra com um rolo, corte em formatos pequenos e asse em forno baixo até ficarem bem secos e crocantes. A vantagem desses biscoitos é que eles não têm conservantes químicos, corantes ou flavorizantes artificiais. Além disso, a aveia é outra fonte excelente de fibra.
Esses biscoitos duram cerca de uma semana em um pote fechado e são ótimos para levar no bolso durante o passeio ou sessões de adestramento. Como são secos, não fazem sujeira e são fáceis de quebrar em pedaços menores. É um carinho feito por você que nutre e educa ao mesmo tempo.
Mitos e Verdades sobre Frutas na Rotina Veterinária
Maçã realmente substitui a escovação dos dentes?
Este é um mito muito difundido. A ideia de que a textura crocante da maçã “raspa” o tártaro dos dentes tem um fundo de verdade mecânica, mas é exagerada. Sim, a mastigação ajuda a remover detritos superficiais e estimula a gengiva, aumentando a salivação que protege a boca. Porém, a maçã tem açúcar.
O açúcar, mesmo natural, se ficar depositado nos dentes, alimenta as bactérias que causam a placa bacteriana. Portanto, dar maçã não substitui a escovação com pasta veterinária. A escovação é a única forma eficaz de remover a placa sob a linha da gengiva onde a doença periodontal começa. Encare a maçã como um petisco que não prejudica tanto os dentes quanto um biscoito rico em amido, mas não como uma escova de dentes comestível.
Se o seu cão tem muito tártaro ou mau hálito, a solução é agendar uma limpeza de tártaro (profilaxia) na clínica e manter a escovação diária. A maçã é coadjuvante, não dentista.
Cães diabéticos e a frutose: Uma análise cuidadosa
O diagnóstico de diabetes em cães muda toda a rotina da casa. A dieta precisa ser rigorosa. A maçã tem um índice glicêmico moderado. Para cães diabéticos estabilizados, que tomam insulina e têm a glicemia controlada, um pedacinho ocasional de maçã geralmente não causa um pico glicêmico perigoso, devido à presença das fibras que retardam a absorção do açúcar.
Contudo, isso deve ser discutido com o veterinário que acompanha o caso. Para cães diabéticos descompensados, qualquer açúcar extra é proibido. Nesses casos, preferimos petiscos proteicos ou vegetais de baixo índice glicêmico, como chuchu ou abobrinha. Nunca assuma que frutas são “liberadas” para diabéticos só porque são naturais. O pâncreas do animal não difere a origem do açúcar, ele apenas tem que lidar com a carga de glicose no sangue.
Sempre monitore a glicemia do seu cão se você introduzir um novo alimento. Se notar aumento na sede ou na urina após começar a dar maçã, corte o petisco imediatamente e converse conosco.
A maçã cura a coprofagia (ato de comer fezes)?
Existe uma crença popular de que adicionar maçã ou abacaxi na dieta faz com que as fezes fiquem com um cheiro desagradável para o cão, desencorajando a coprofagia. Na prática clínica, os resultados são mistos. Alguns tutores relatam sucesso, outros não veem mudança nenhuma.
A coprofagia é um problema comportamental e fisiológico complexo. Pode ser falta de nutrientes, tédio, ansiedade ou hábito. A maçã pode ajudar se a causa for uma deficiência de fibras ou má digestão, pois ela melhora o trânsito intestinal. Mas não é uma pílula mágica. Se seu cão come fezes, precisamos investigar a causa raiz, fazer exames de fezes para descartar parasitas e talvez entrar com probióticos específicos e adestramento, além da dieta.
Não custa tentar oferecer maçã como parte da estratégia, mas não deposite todas as suas esperanças nisso. A resolução desse problema geralmente exige uma abordagem multifatorial.
Comparativo Nutricional de Petiscos Naturais
Muitas vezes você pode ficar na dúvida entre qual fruta oferecer. Preparei um quadro simples comparando a maçã com outras duas opções populares para te ajudar a decidir qual o melhor petisco para o momento do seu cão.
| Característica | Maçã (Sem semente) | Banana | Melancia |
| Calorias | Moderada. Ótima para o dia a dia. | Alta. Rica em açúcar e carboidratos. | Baixíssima. Quase apenas água. |
| Fibras | Alto teor (especialmente na casca). Bom para o intestino. | Médio teor. Pode prender o intestino se dada em excesso. | Baixo teor de fibras, alto teor de água. |
| Vitaminas | Destaque para A e C. | Rica em Potássio e B6. Energia rápida. | Rica em Licopeno e hidratação. |
| Indicação Principal | Imunidade, limpeza dos dentes (leve) e saciedade. | Cães muito ativos que precisam de energia pós-treino. | Dias muito quentes para repor líquidos. |
| Cuidados | SEMENTES SÃO TÓXICAS. | Excesso engorda rápido. | Retirar sementes e casca dura. Diurética. |
Como você pode ver, a maçã é o “meio-termo” perfeito. Menos calórica que a banana, mas com mais fibras e substância que a melancia. É o petisco coringa ideal para a maioria das situações.
Considerações Finais sobre a Introdução Alimentar
O teste de tolerância individual
Cada organismo é único. O que faz bem para o cão do vizinho pode cair mal para o seu. Sempre que introduzir a maçã (ou qualquer alimento novo), faça o teste de tolerância. Dê um pedaço pequeno e espere 24 horas. Observe o comportamento, o apetite e, principalmente, as fezes. Se tudo continuar normal, você pode incorporar na rotina. Se houver vômito ou fezes amolecidas, o organismo dele pode ter sensibilidade à acidez ou à fibra da fruta. Respeite a individualidade biológica do seu pet.
Acompanhamento das fezes como indicador de saúde
Como veterinário, sou obcecado por fezes, e você também deveria ser. Elas são o melhor relatório diário de saúde que seu cão te entrega. Ao dar maçã, é normal ver pequenos pedacinhos de casca nas fezes, pois a celulose não é totalmente digerida. Isso não é problema. O problema é se as fezes ficarem líquidas, com muco ou sangue. Manter um olho nisso garante que você perceba rapidamente se a dieta está adequada ou se precisa de ajustes.
Quando procurar ajuda profissional
Se você tem dúvidas sobre a quantidade exata para o peso do seu cão, ou se ele tem condições preexistentes (alergias, problemas renais, cardíacos), não hesite em marcar uma consulta nutricional. Nós podemos calcular a necessidade calórica exata e prescrever a quantidade de maçã em gramas, para que você possa mimar seu amigo com total segurança científica.
A maçã é um presente da natureza que, com os cuidados certos — sem sementes e com moderação — pode trazer alegria e saúde para a vida do seu cachorro. Aproveite esse momento de conexão com ele, ofereça um cubinho crocante e veja o rabo abanar. Afinal, saúde também é felicidade.


