A proteção contra ectoparasitas deixou de ser apenas uma questão de conforto para o animal e tornou-se uma necessidade de saúde pública. Quando recebo tutores no consultório preocupados com coceiras ou carrapatos, sempre redireciono a conversa para um perigo maior e silencioso. A Leishmaniose Visceral Canina é uma zoonose grave e a prevenção é a única ferramenta realmente eficaz que temos em mãos hoje. A coleira Scalibor® da MSD Saúde Animal não é apenas um acessório. Ela representa uma tecnologia de ponta no combate ao vetor dessa doença.
O modelo de 19g com 48cm é especificamente desenhado para cães de porte médio. O ajuste correto e a compreensão de como o produto age no organismo do seu pet são fundamentais. Muitos tutores compram o produto mas falham na aplicação ou no entendimento da troca. Isso cria janelas de vulnerabilidade que o mosquito palha aproveita. O objetivo aqui é dissecar tecnicamente, mas de forma clara, como essa coleira protege seu cão e sua família.
Não estamos falando apenas de matar pulgas. Estamos falando de repelência. A capacidade de impedir que o mosquito se alimente do sangue do seu cão é o que chamamos de “padrão ouro” na medicina veterinária preventiva. Vamos aprofundar nos mecanismos fisiológicos e químicos que tornam a Scalibor uma escolha frequente nas minhas prescrições clínicas. Entender o produto é o primeiro passo para garantir a saúde do seu melhor amigo.
A Tecnologia da Deltametrina e o Mecanismo de Ação
A liberação lipofílica através da camada sebácea
A eficácia da Scalibor reside na sua matriz de liberação lenta. A coleira é impregnada com Deltametrina a 4%. Diferente de comprimidos que precisam ser metabolizados pelo fígado e circular na corrente sanguínea, a Scalibor age superficialmente. A Deltametrina é uma molécula lipofílica. Isso significa que ela tem afinidade por gordura. Ao colocar a coleira no pescoço do cão, o atrito constante libera o princípio ativo.
Esse ativo se funde com a camada lipídica da pele do animal. O sebo natural que cobre a derme do cão funciona como um veículo transportador. É fascinante observar como a substância se espalha por todo o corpo, do focinho à ponta da cauda, sem jamais entrar na circulação sistêmica em níveis significativos. Isso garante uma segurança hepática e renal muito superior a outros métodos sistêmicos.

O processo de distribuição total demora cerca de duas semanas para atingir o pico de concentração. Por isso a insistência em colocar a coleira antes de viagens para áreas endêmicas. Não é mágica instantânea. É uma saturação progressiva da camada gordurosa da pele que cria uma capa protetora invisível em torno do animal.
O efeito “Anti-Feeding” e o bloqueio da picada
O conceito mais importante que você precisa dominar é o efeito anti-feeding, ou anti-alimentação. O mosquito vetor da Leishmaniose, o flebotomíneo, precisa picar para transmitir o protozoário. A maioria dos produtos mata o parasita depois da picada. Na Leishmaniose, se o mosquito picar, a transmissão pode já ter ocorrido. O risco é inaceitável.
A Deltametrina presente na pele do cão causa uma hiperexcitação nervosa no mosquito assim que ele pousa no animal. Chamamos isso de efeito “pé quente”. O inseto sente um desconforto térmico e químico imediato. Ele não consegue iniciar o processo de alimentação. Ele fica desorientado e foge antes de inserir o aparelho bucal na pele do cão.
Essa repelência é o que diferencia uma coleira comum de uma coleira com indicação para Leishmaniose. Evitar a picada é evitar a inoculação da doença. Estudos mostram que a Scalibor atinge níveis altíssimos de repelência contra o Lutzomyia longipalpis. É essa barreira química que protege seu cão enquanto ele dorme no quintal ou passeia no fim da tarde.
Ação neurotóxica exclusiva para os parasitas
A segurança farmacológica é uma prioridade na minha rotina clínica. Muitos tutores temem que a “química” da coleira faça mal ao cão. A Deltametrina atua nos canais de sódio das células nervosas dos parasitas (mosquitos, carrapatos e pulgas). Ela causa uma paralisia espástica seguida de morte do inseto ou aracnídeo.
A fisiologia dos mamíferos é muito diferente da dos insetos. A toxicidade da Deltametrina para cães é extremamente baixa nas dosagens liberadas pela coleira. Além disso, como mencionado, a absorção dérmica para a corrente sanguínea é insignificante. O produto fica onde deve ficar: na parte externa da pele e nos pelos.
Isso permite que cães sensíveis ou que tomam outras medicações possam usar a coleira com segurança. Claro que reações locais de hipersensibilidade podem ocorrer, como em qualquer produto tópico. Mas o mecanismo de ação é desenhado para ser letal para o vetor e inócuo para o hospedeiro vertebrado. É a biotecnologia trabalhando a favor da segurança.
O Protocolo de Uso Correto para Eficácia Máxima
O ajuste de dois dedos e o contato com a pele
Vejo erros de aplicação quase diariamente. Uma coleira frouxa é o mesmo que nenhuma coleira. Para que a liberação da Deltametrina ocorra, precisa haver atrito com a pele e calor corporal. Se a coleira estiver “sambando” no pescoço, ficando por cima dos pelos sem tocar a pele, o princípio ativo não será liberado corretamente.
A regra de ouro é a dos dois dedos. Você deve ajustar a coleira de modo que consiga passar apenas dois dedos entre o pescoço do cão e o objeto. Nem estrangulando, nem pendurada como um colar de pérolas. Esse ajuste garante o contato contínuo necessário para a difusão do fármaco pela camada lipídica.
Cães em fase de crescimento precisam de verificação semanal. O que estava justo hoje pode estar apertado semana que vem. Corte a sobra da coleira deixando cerca de 5 cm após a fivela. Isso evita que a ponta fique sobrando e o cão tente morder, o que poderia causar uma intoxicação oral por ingestão do plástico.
O período de latência: Por que esperar antes de expor o animal
A ansiedade do tutor pode comprometer a proteção. Colocar a coleira hoje e levar o cão para a praia ou sítio amanhã é um erro estratégico. Como expliquei, a distribuição do ativo pela gordura da pele leva tempo. A bula indica eficácia máxima após 2 a 3 semanas de uso contínuo.
Durante essa janela inicial, o animal não está 100% protegido. Se você mora em área endêmica, recomendo o uso associado de pipetas repelentes nesse período de transição ou manter o cão em ambiente telado. O planejamento é parte da profilaxia. Se vai viajar em dezembro, a coleira deve ser colocada em novembro.
Esse delay fisiológico é normal em produtos de matriz sólida. Não significa que o produto é ruim. Significa que ele depende da fisiologia da pele para funcionar. Respeitar esse tempo biológico é crucial para não ter uma falsa sensação de segurança.
Manejo de banhos e a integridade da matriz polimérica
A relação da Scalibor com a água gera muitas dúvidas. A Deltametrina não sai facilmente com água porque é lipofílica (gosta de gordura, não de água). Banhos eventuais de chuva ou mergulhos rápidos não removem a proteção completamente. No entanto, banhos frequentes com xampus agressivos removem a camada de gordura da pele.
Ao remover o sebo com xampus de limpeza profunda ou dermatológicos, você remove temporariamente a “estrada” por onde a Deltametrina viaja. O ideal é retirar a coleira antes do banho e recolocá-la quando o cão estiver seco. E evite usar xampus que removem a oleosidade natural excessivamente se não houver indicação médica.
A própria coleira deve ser limpa apenas com um pano úmido se estiver suja de terra. O uso de produtos químicos em cima da coleira pode degradar a matriz polimérica e alterar a liberação do ativo. Trate a coleira como um dispositivo médico de liberação controlada, não apenas como um acessório de plástico.

Comparativo Técnico: Scalibor vs. Soluções Alternativas
Para facilitar sua decisão, elaborei um quadro comparativo técnico entre a Scalibor e dois concorrentes diretos no mercado brasileiro, considerando o foco em Leishmaniose.
| Característica | Scalibor (MSD) | Seresto (Elanco) | Leevre (Ourofino) |
| Princípio Ativo | Deltametrina 4% | Imidacloprida + Flumetrina | Deltametrina + Propoxur |
| Foco Principal | Repelência de Flebotomíneos (Leishmaniose) | Pulgas e Carrapatos (Multifunção) | Ectoparasitas gerais + Leishmaniose |
| Duração (Leishmaniose) | 4 meses (Alta eficácia comprovada) | Até 8 meses (Repelência indireta) | Até 6 meses (Segundo bula) |
| Tamanho | 48cm (Média) e 65cm (Grande) | P (38cm) e G (70cm) | 48cm e 63cm |
| Resistência à Água | Moderada (retirar no banho) | Alta | Moderada (retirar no banho) |
Diferenças de princípios ativos
A Scalibor aposta na pureza e concentração da Deltametrina. É uma molécula consagrada especificamente para a repelência do mosquito palha. A Seresto utiliza a Flumetrina que, embora tenha efeito repelente (efeito “hot foot”) contra carrapatos e ajude na prevenção da Leishmaniose, seu foco primário de marketing e formulação é o controle de pulgas e carrapatos por longo prazo.
A Leevre combina a Deltametrina com Propoxur. Essa associação visa aumentar o espectro de ação contra outros ectoparasitas. No entanto, na minha prática clínica, prefiro a especificidade da Scalibor quando o foco é área endêmica de Leishmaniose. Menos interações químicas na pele do animal muitas vezes resultam em menos reações alérgicas locais.
Cada produto tem seu lugar na medicina veterinária. Se o seu cão vive em um apartamento alto e só desce na rua pavimentada, a necessidade é uma. Se ele vai para o litoral ou interior, onde o flebotomíneo é rei, a Deltametrina da Scalibor continua sendo a referência técnica mais robusta para essa finalidade específica.
Custo-benefício a longo prazo
Ao avaliar o preço, o tutor costuma olhar apenas o valor de caixa. Precisamos calcular o custo por mês de proteção efetiva. A Scalibor deve ser trocada a cada 4 meses para garantir a proteção máxima contra o mosquito. Embora a bula mencione proteção maior para carrapatos e pulgas, para o mosquito vetor, não arriscamos passar de 4 meses.
Produtos que prometem 8 meses parecem mais baratos, mas é preciso ler as letras miúdas sobre a eficácia da repelência do mosquito especificamente nesses meses finais. Muitas vezes, a eficácia repelente cai antes da eficácia carrapaticida. Portanto, 3 coleiras Scalibor cobrem um ano inteiro com níveis de Deltametrina sempre no pico.
O custo de tratar uma Leishmaniose — exames, medicações caras como Milteforana, acompanhamento renal vitalício — é infinitamente superior ao investimento em três coleiras por ano. A prevenção é, sem dúvida, a medida mais econômica na vida do seu pet.
Espectro de ação parasita
A Scalibor 19g também age contra carrapatos (Rhipicephalus sanguineus) e pulgas (Ctenocephalides felis), além de moscas comuns (Stomoxys calcitrans). Isso a torna um produto completo. Porém, sua fama e sua maior força residem na barreira contra o mosquito.
Em infestações massivas de pulgas no ambiente, às vezes é necessário associar um comprimido de ação rápida (knock-down imediato) para limpar o animal, mantendo a coleira para a proteção residual e repelência. Nenhuma coleira é capaz de controlar sozinha uma infestação ambiental severa de pulgas instantaneamente.
Para carrapatos, a Scalibor tem excelente eficácia, matando o parasita antes que ele consiga transmitir doenças como a Erliquiose ou Babesiose na maioria dos casos. A paralisia do carrapato impede a fixação prolongada necessária para a transmissão dessas hemoparasitoses.
Mitos e Verdades sobre a Leishmaniose Visceral Canina
A coleira sozinha resolve tudo?
Este é o mito mais perigoso. A coleira é uma ferramenta poderosa, mas não é um campo de força impenetrável de ficção científica. Nenhum método preventivo é 100% eficaz isoladamente. Existe o que chamamos de “falha terapêutica” ou variações individuais na produção de sebo do cão que podem diminuir a eficácia.
A proteção deve ser “multimodal”. Isso significa usar múltiplas camadas de proteção. A coleira é a base. Mas evitar passeios no crepúsculo (hora que o mosquito sai para jantar), manter o quintal limpo e usar repelentes de tomada no ambiente interno somam pontos na segurança.
Depositar toda a responsabilidade apenas na coleira, ignorando o ambiente, é jogar com a sorte. A Scalibor reduz drasticamente a chance de picada, mas o manejo do tutor completa a equação de proteção.

Vacina versus Coleira Repelente
Muitos tutores chegam com a carteirinha de vacinação em dia e perguntam: “Doutor, já vacinei contra Leishmaniose, posso parar de usar a coleira?”. A resposta é um sonoro NÃO. A vacina e a coleira têm funções completamente diferentes e complementares.
A coleira evita a infecção. Ela impede que o parasita entre no corpo do cão. A vacina atua se o parasita entrar, ajudando o sistema imune a combater a doença e evitar que ela progrida para formas graves. A vacina não impede a picada. A vacina não é repelente.
Além disso, a vacina protege o cão, mas a coleira protege a saúde pública. Ao impedir a picada, a coleira evita que o mosquito se infecte no cão e transmita para humanos ou outros cães. O Ministério da Saúde recomenda o uso de coleiras repelentes como medida primária de controle. A dupla Vacina + Scalibor é a melhor blindagem possível atualmente.
Cães de apartamento precisam usar?
A ideia de que o mosquito palha só vive no meio do mato é antiquada. O Lutzomyia se adaptou perfeitamente ao ambiente urbano. Ele se reproduz em matéria orgânica úmida: um vaso de planta, folhas acumuladas na calha, restos de frutas no lixo do vizinho.
Se você mora em andar alto, o risco é menor devido à altura de voo do mosquito, mas você desce com o cão para fazer as necessidades, certo? É nesse momento, geralmente no fim da tarde ou início da noite, que o encontro acontece. O vento também pode levar os vetores para andares mais altos.
Portanto, cães de cidade, de apartamento e de sofá não estão imunes. A Leishmaniose está presente em grandes centros urbanos. A prevenção deve ser feita independentemente do estilo de vida do animal, ajustando apenas a intensidade das medidas ambientais.
Manejo Ambiental Integrado: Potencializando a Proteção
O ciclo do flebotomíneo e a matéria orgânica
Você precisa entender o inimigo para vencê-lo. O mosquito palha não põe ovos na água parada como o da Dengue. Ele põe ovos em terra úmida e rica em matéria orgânica. Fezes de animais, folhas em decomposição, frutos caídos apodrecendo no chão. Esse é o berçário do transmissor da Leishmaniose.
O uso da Scalibor no cão deve ser acompanhado de uma limpeza rigorosa do quintal. A “higiene ambiental” é o termo técnico. Recolher as fezes imediatamente, podar árvores para aumentar a incidência de sol no solo (o sol mata as larvas do mosquito) e cimentar áreas de terra excessiva ajudam no controle.
Se o seu quintal é um buffet para as larvas do mosquito, a população de vetores será tão alta que a pressão sobre a coleira do seu cão será imensa. Reduza o nascedouro dos mosquitos e a coleira fará o trabalho dela com muito mais folga e eficiência.
Telas milimétricas e horários de passeio
A física também ajuda. O mosquito palha é minúsculo, menor que um pernilongo comum. Telas de mosquito padrão muitas vezes não o barram. É necessário instalar telas com malha milimétrica (malha fina, específica para flebotomíneos) nas janelas e canis.
O comportamento do vetor é crepuscular e noturno. O risco de transmissão explode após as 17h. Mudar a rotina de passeios para horários de sol forte diminui drasticamente a exposição ao risco. Se precisar sair à noite, a coleira deve estar nova e o cão deve estar em movimento constante.
Essas barreiras físicas complementam a barreira química da Deltametrina. É um cerco que fechamos contra a doença. Quanto mais difícil for para o mosquito chegar ao seu cão, maior o sucesso da profilaxia.
A importância do check-up veterinário regular
Mesmo com coleira, vacina e telas, a biologia não é uma ciência exata. Recomendo aos meus pacientes que realizem testes sorológicos anuais para Leishmaniose. Diagnosticar a doença precocemente muda totalmente o prognóstico.
Muitos cães são assintomáticos. Eles têm o parasita, mas não apresentam feridas ou emagrecimento visível inicialmente. Apenas o exame de sangue pode detectar. O uso da Scalibor não isenta a necessidade de acompanhamento médico.
A saúde do seu cão é um conjunto de ações. A Scalibor 19g é, sem dúvida, uma das ferramentas mais robustas que temos. Ela oferece tecnologia, segurança e praticidade. Mas o amor e o cuidado atento do tutor, seguindo essas diretrizes de manejo, são o que realmente garante uma vida longa e saudável ao lado do seu pet. Proteja quem você ama com o que há de melhor na ciência veterinária.

